domingo, 25 de agosto de 2019

Casa de chá em Vila Real









Numa manhã de junho sentado à mesa de uma
casa de chá em Vila Real tive um sonho que
me espantou e as imaginações na minha cama,
em S. Gonçalo, no Marão,
e as visões na minha cabeça me turvaram.

Por mim se fez este balcão pelo
qual foram introduzidos à minha presença os
frades domínicos da Sé, ali defronte.
Vinham dar-me a interpretação das cornijas
acachorradas da sua casa.

Entraram os frades segundo o nome do nosso
deus. Eu contei-lhes o sonho.

Crescia uma árvore que quase chegava ao céu.
Vinha da margem do Corgo, passava a
cidade, chegava bem alto.
Ao lado falavam d'antigos namorados entre o
coração e o terror

o pressentimento do futuro. Falavam
já dos melhores trechos do bispo Osório,
admirável em latim.
Ao lado crescia aquela árvore
cuja altura era grande dentro e fora da

minha cabeça.
Viam as aves do céu fazerem morada
nos ramos, os frades acharam sombra
sob as traves de madeira da sua igreja e
cantavam derrubai a árvore cortai-lhe os

ramos sacudi as folhas.
A única coisa a fazer era beber o chá e
esperar pela esquina da avenida.


João Miguel Fernandes Jorge, A pequena pátria, in Tronos e dominações, Editorial Presença, Lisboa, 2002.


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