Este filme de Leitão de Barros marca, com “Douro Faina Fluvial”, de Manoel de Oliveira, uma transição importante no caminho do cinema português. Situado mesmo no fim do período mudo, incita uma notória modernidade formal, antes de tudo no modo como miscigena a ficção (utilizando atores profissionais) com o pendor documental. Evidencia-se o sentido plástico do realizador no olhar que impõe sobre os rostos das gentes da Nazaré e na composição dos planos, irrompe um sopro de lubricidade no modo como a câmara indaga os corpos das mulheres jovens, há um ritmo na montagem que mostra a consciência da linguagem cinematográfica. Tudo isto acontece sobre um fio de história em tom de melodrama bastante mais convencional do que a forma como é filmada.
A música de Bernardo Sassetti acrescenta modernidade ao filme. Embora recorra a temas que ecoam antigos reconhecimentos, fá-lo numa dimensão de quase olvido, como se pairassem e só existissem deveras num passado que passou. A banda sonora sublinha o carácter fantasmático que todo o cinema mudo agora tem face aos nossos hábitos audiovisuais, o que serve sobremaneira a pujança da obra de Leitão de Barros, até porque rasura algumas das suas insuficiências.
Jorge Leitão Barros. "Culturas", in Expresso Semanário#2537, de 11 de junho de 2021
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