Maria da Luz Correia & Carla Cerqueira
Nº 1 | 2017 | Sopcom/GT Cultura Visual
ISSN:e-ISSN 2184-1284
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É uma revista científica de Cultura Visual e de Artes Digitais. Pretende promover o debate transdisciplinar em torno dos processos de mediação visual da cultura, que além dos estudos sobre fotografia, cinema, televisão, publicidade, jogos de vídeo, média digitais, inclui hoje as artes tecnológicas e as media arts.
A revista foi criada em 2015 pelo Grupo de Trabalho de Cultura Visual da Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação (Sopcom) e, no segundo semestre de 2020, passou a ser editada pelo Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS), do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho.
Não é preciso ser triste para ser militante
Michel Foucault
Este é o primeiro número da vista. Tem a sua primeira edição dedicada às assimetrias sociais que os regimes escópicos conformam ou desafiam. Homenageando a motivação política dos visual culture studies que nos anos 90 do século XX deram um novo fôlego ao estudo da imagem, e reivindicando a importância fundadora das teorias críticas da vigilância e do espetáculo e dos estudos das desigualdades de género e de etnia, este número inaugural quer também dar conta do caráter dinâmico dos processos de partilha do visível, confrontando os imaginários hegemónicos e as visibilidades dominantes com as visões alternativas e os olhares de resistência.
[...]
A vista ocupa-se de imagens. O seu objeto é a iconografia social quotidiana e a produção visual diária e o seu nome é também, neste sentido, e em certa medida, um parti-pris. Conforme Rosalind Krauss (1985:139) assinala no texto Photography’s Discursive Spaces, com o aparecimento da fotografia, é o termo “vista” que sucede à designação de “paisagem” [1]. Usada pelos primeiros fotógrafos para fazer referência aos negativos resultantes das suas expedições, a ideia de vista remete-nos, então, para o universo da produção mecânica de imagens, assinalando a passagem de um mundo olhado a partir da perspetiva da arte e da imagem aurática a um mundo representado a partir do horizonte da cultura visual e da imagem técnica, como o diagnosticou exemplarmente, no início do séc. XX, Walter Benjamin (2012).
Remonta ao início do séc. XX, a pensadores como o filósofo Walter Benjamin e o historiador de arte Aby Warburg, e tem sido reforçado nas últimas décadas, o esforço no sentido de alargar o heterogéneo domínio dos estudos da imagem à experiência visual quotidiana, procurando refutar esquemas hierárquicos que opõem o high ao low, a arte popular à arte erudita, e privilegiando, ao contrário, os intervalos de convergência que diariamente enredam a arte e a não arte [2]. Com artigos dedicados à banda desenhada, à publicidade, à fotografia vernacular, à televisão, ao vídeo, às artes participativas, à performance e ao cinema, este número da Vista inscreve-se na continuidade desta crescente atenção à circulação social de imagens, à “cultura das mídias”, para usar os termos de Lucia Santaella (2010), à “cultura dos ecrãs” na aceção de Moisés de Lemos Martins (2011), que têm olhado a nossa cultura visual sob a perspetiva da hibridez, da mistura, do trânsito e do movimento.
[1] É de notar que no ensaio Povos Expostos, Povos Figurantes, traduzido neste primeiro número da vista, Georges Didi-Huberman (2012) faz também referência ao habitual emprego do termo “vistas” no domínio do dito cinema primitivo, como se pode constatar nos seguintes excertos: “Acrescentemos que a fita medindo apenas dezassete metros –para um total de cerca de oitocentos fotogramas ou ‘vistas’, como se dizia então”; “Basta folhear o catálogo das ‘vistas Lumière’ para compreender o significado considerável...”; “Toda a questão reside em saber, afinal, de que maneira e em vista de quê estas “vistas” se expunham.”.
[2] Inspiramos a nossa formulação nesta lúcida clarificação de W. T. Mitchell: “O facto de alguns investigadores quererem abrir o domínio das imagens, considerando imagens artísticas e não artísticas, não abole automaticamente as diferenças entre estes dois domínios. Podemos facilmente argumentar que os limites entre a arte e a não arte só se tornam mais claros quando olhamos para os dois lados dessa instável fronteira e traçamos as transações e as traduções entre eles.” (Mitchell, 2002, p.173); tradução das editoras.
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