domingo, 28 de julho de 2019

História do mundo em doze mapas



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HISTÓRIA DO MUNDO EM DOZE MAPAS 
de Jerry Brotton, trad. de Jaime Araújo, 
Edições 70, 2019, 579 págs.



“Um mapa do mundo correto é coisa que não existe e nunca existirá. O paradoxo, contudo, é que nunca poderemos reconhecer o mundo (...) sem um mapa”. Assim conclui, não por acaso, História do Mundo em Doze Mapas.

Durante grande parte da História, as limitações de visão eram enormes, e os primeiros mapas estão cheios de erros que hoje quase nos enternecem. Um dos mapas a que a presente obra dedica um dos seus 12 capítulos foi elaborado em 1154 pelo cartógrafo muçulmano al-Sharif al-Idrisi. Parte de um livro onde havia outros 70 que mostravam regiões concretas, esse mapa celebra as tradições sincréticas de então na Sicília, para cujo monarca foi elaborado. Apenas um exemplo de como não há mapas sem ideologia ou pelo menos sem uma segunda intenção, boa ou má. A um nível ainda mais óbvio, o mapa de Hereford, criado por volta de 1300 em Inglaterra, põe Jerusalém no centro do mundo e o Leste no topo, com Cristo por cima; o percurso que se pretende desenhar é tão geográfico como espiritual. 

A partir do final da Idade Média e no Renascimento, as viagens de exploração permitiram graus crescentes de acuidade, mas mesmo aí as distorções não acabaram. Um exemplo óbvio é o mapa que em 1529 o cartógrafo português Diogo Ribeiro, então ao serviço da coroa espanhola, elaborou para fazer com que as Molucas acabassem nas mãos de Espanha, não de Portugal. Na verdade, elas ficavam além dos territórios atribuídos a Espanha pelo Tratado de Tordesilhas, mas Ribeiro tinha consciência do que lhe competia fazer. 

Jerry Brotton, professor de estudos do Renascimento na Queen Mary University, em Londres, dá o devido destaque a Mercator (como deu a Ptolomeu, logo ao início) e recupera algumas histórias fundamentais, como a da família Cassini, primeira a tentar representar integralmente um país num mapa, ou a da Projeção de Peters, que pretendeu corrigir as distorções tendenciosas do tamanho relativo dos vários continentes — distorções que, curio­samente, permanecem hoje em muitos mapas. 

O último dos 12 capítulos é dedicado ao Google Earth, que, naturalmente, também não é perfeito. Cada capítulo, além de falar de um mapa concreto, refere as circunstâncias pessoais, históricas e científicas que o rodearam. Sem esquecer os aspetos de produção, sempre vitais.


Luís M. Faria
E-Revista Expresso, 20 de julho de 2019

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