quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Comunique, não complique!

 























comunicar

comunicar | v. tr. | v. intr. | v. pron.

co·mu·ni·car 

- Conjugar

(latim communico, -are, pôr ou ter em comum, repartir, dividir, reunir, misturar, falar, conversar)
verbo transitivo

1. Pôr em comunicação.

2. Participar, fazer saber.

3. Pegar, transmitir.

verbo intransitivo

4. Estar em comunicação.

5. Corresponder-se.

verbo pronominal

6. Propagar-se.

7. Transmitir-se.


"comunicar", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/comunicar [consultado em 29-08-2022].




 

 


 

 

 

 

COMUNIQUE, NÃO COMPLIQUE! 

 

'Ninguém gosta de perder tempo. E quando falamos de comunicação, ninguém quer perder o seu precioso tempo a tentar descortinar enigmas frásicos, discursos palavrosos, palavras embaraçosas. Toda a gente quer entender tudo à primeira. 

 
1. Use palavras simples

As palavras são a matéria-prima da comunicação, por isso, devemos escolhê-las criteriosamente em função do nosso interlocutor. É para ele que falamos ou escrevemos, verdade?

Para que qualquer mensagem seja eficaz e cumpra o seu objetivo, as palavras não devem ser difíceis e desconhecidas, uma vez que dificultam a compreensão da mensagem e desmotivam quem a recebe. Por exemplo, para quê usar a palavra monitorização, em vez de controlo? Ou o verbo agudizar, em vez de piorar? Ou a palavra inviabilização, em vez de impedimento?

Evite o uso exibicionista de palavras eruditas e complicadas e opte sempre por palavras simples, comuns e reconhecidas instantaneamente pelo seu interlocutor, para que a comunicação flua como um rio e não se torne uma difícil escalada no Everest!
 

2. Use frases curtas

Além de palavras simples, utilize também frases curtas. O seu interlocutor deseja compreender de imediato o que lê ou ouve, quer receber a mensagem com prazer e sem esforço.

Frases demasiado longas são um tropeço ao processamento da mensagem, por isso, use frases breves, na ordem direta (sujeito, predicado, complementos), para serem facilmente entendidas.

Para quê dizer “indisponibilidade temporária dos serviços de eletricidade”, se pode dizer “falta de luz”? Ou “alcançar uma vitória eleitoral”, se é muito mais simples dizer “ganhar as eleições”?

Descomplique sempre o seu discurso. O seu interlocutor ficar-lhe-á muito agradecido!

 3. Seja breve e objetivo

Comunicar com clareza é também respeitar a memória do seu interlocutor. Textos e discursos longos e demasiado palavrosos são a desculpa perfeita para ele desistir de o ouvir ou ler, por isso, se quer mantê-lo consigo, então seja breve e objetivo!

Um bom comunicador é aquele que consegue transmitir uma mensagem útil e interessante num curto período de tempo.

Respeitar o tempo de quem o ouve é mais do que lhe agradar. É dar-lhe honra.


4. Evite terminologia técnica

Evite também utilizar termos técnicos quando comunica, mas se a situação assim o exigir, deverá sempre explicitar esses termos, usando exemplos claros, preferencialmente.

Se um médico, ao falar com um paciente, usar os termos ablepsia e síncope, deverá ter o cuidado de explicitar o seu significado: “cegueira” e “desmaio”, respetivamente.

Lembre-se: a comunicação não deve ser uma corrida de obstáculos, por isso, por mais complexa que seja a mensagem, um bom comunicador é aquele que a consegue sempre descomplicar.

Fonte
in edição digital da revista Visão do dia 11/04/2018.', in Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/artigos/rubricas/idioma/comunique-e-nao-complique-a-clareza-na-comunicacao/3634 [consultado em 29-08-2022] 


terça-feira, 30 de agosto de 2022

Linguagem inclusiva?

 








As duas primeiras vezes que me deparei de caras com a agora chamada “linguagem inclusiva” aconteceram no Brasil e apenas me fizeram sorrir, longe de imaginar que mais tarde se tornaria moda e que de moda passaria a certidão de bom comportamento cívico e daí a quase imperativo — tão inútil, tão absurdo e tão idiota quanto o ridículo Acordo Ortográfico da língua portuguesa: o mais patético e humilhante documento jurídico alguma vez assinado por um Governo português.

A primeira vez, aconteceu estava eu a fazer um filme de 60 minutos para a RTP sobre a história da colonização portuguesa da Amazónia — (um projecto editorial que hoje, apenas pelo seu objecto, obviamente não seria autorizado). E estava então em trânsito numa daquelas cidadezinhas amazónicas com nomes do Ribatejo — Santarém ou Almeirim, já não recordo —, quando uma noite me deparo com um comício eleitoral para a prefeitura local, a decorrer numa praça ao ar livre. Sobe ao palanque um candidato com pinta de jagunço dos livros do Jorge Amado, bate três vezes no microfone para se certificar que funcionava, e começa: “Meus povos...” Porém, detém-se, olha a plateia, faz uma pausa e recomeça. “E minhas povas.” Estávamos em 1987.

A segunda vez aconteceu vários anos depois, em Brasília, quando fui entrevistar Dilma Rousseff, acabada de ser eleita Presidente do Brasil. Antes de entrar para a entrevista, uma sua assessora perguntou-me se eu estava ciente de que a Presidente Dilma gostava de ser tratada por “presidenta”. Na verdade eu já tinha ouvido uns zunzuns sobre isso, mas fiz-me de parvo: “Sabe, eu falo português de Portugal. E lá, o substantivo presidente não tem género, tanto se aplica a um presidente homem como mulher. Se eu tratasse a presidente Dilma por ‘presidenta’, teria de tratar um Presidente homem por ‘presidento’. E, mais ainda: a senhora, por exemplo, teria de tratar o polícia federal que está ali fora por ‘senhor polício’.”

Porém, o que então me parecia anedótico agora é real. Mas não porque os princípios tenham mudado ou porque a necessidade de lutar por eles tenha cessado. A luta contra a discriminação de género mantém-se actual e imperiosa em muitos lugares e muitas situações; o mesmo contra a discriminação sexual e mais ainda contra o racismo. O que mudou foi o discurso e, sobretudo, os intérpretes do discurso: esta auto-instituída vanguarda de aiatolas do pensamento autorizado e do protagonismo consentido que decretou quem é que pode falar em nome dos discriminados e defender os seus direitos, quem é que está autorizado a homenagear a sua cultura e respeitar os seus modos de vida, ficando todos os outros reduzidos ao silêncio, sentenciados como hipócritas e expiando as culpas seculares dos seus antanhos. A única coisa que os distingue dessa nobre Comissão para a Promoção da Virtude e Repressão do Vício que zela pela pureza islâmica na Arábia Saudita é que a estes ainda não lhes é possível cortar as mãos aos infiéis, mas apenas cortar-lhes as boas intenções, nessas madraças do terrorismo de massas que são as redes sociais (e é bem feito para as suas vítimas; ando há anos a pregar-lhes a solução: se se atreverem a viver sem as redes sociais, o que não custa nada, o veneno das víboras não os atinge, transforma-se em baba dentro da boca destas). Dá assim dó ver esses incautos que saem à contenda, carregados de boa consciência e boas intenções, contra os novos aiatolas e os seus mandamentos sobre a “linguagem inclusiva”, a “apropriação cultural” e o “movimento woke”, convencidos, ingenuamente, de que vão ao encontro de uma discussão séria. Não vão: estes fanáticos não querem nem discutir nem convencer. Querem proibir, atemorizar, afugentar da luta contra o racismo e a discriminação quem não pertence à tribo: “Se és branco, és necessariamente racista; se és heterossexual, és homofóbico; e se és homem, és obviamente machista.” A extrema-direita agradece e, graças a eles, cresce. 

Mas isso pouco lhes importa. Aliás, nada mais lhe importa; e basta lê-los na imprensa de referência que lhes dá acolhimento: nem a guerra que devasta a Europa, nem os miseráveis que morrem afogados a atravessar de África para um paraíso sonhado, nem o planeta que se extingue à nossa vista. São capazes de fazer abaixo-assinados a apelar aos jornais para censurarem quem não escreve segundo a novilíngua, mas dormem tranquilos enquanto os talibãs proíbem as mulheres afegãs de irem à escola ou de trabalharem; são capazes de se indignarem porque a Rita Pereira põe tranças afro, o que acham uma usurpação cultural, mas estão-se nas tintas para os desgraçados escravos asiáticos da agricultura alentejana — porque são apenas amarelos e não pretos. Na verdade, não enxergam nada de mais importante além do próprio umbigo. Como se a auto-invocada superioridade moral da sua litigância e do seu protagonismo os dispensasse de olhar para o mundo. No fundo, não passam de uma gente sem causas que importem.

Miguel Sousa Tavares. A era da estupidez, in Expresso Semanário#2600, de 26 de agosto de 2022. O escritor escreve de acordo com a antiga ortigrafia.


📌Sabia que:

Em 1999, a UNESCO editou um Guia sobre a línguagem neutra em função do sexo, sublinhando que: A linguagem não reflete apenas o modo como pensamos: também forma o nosso pensamento. Se palavras e expressões que pressupõem que as mulheres são inferiores aos homens são reiteradamente usadas, o assumir desta inferioridade tende a tornar-se parte da nossa mentalidade.?

Em 2008, o Parlamento Europeu foi uma das primeiras organizações internacionais a adotar orientações multilingues para a utilização de uma Linguagem neutra do ponto de vista do género?

Em 2021, o CES - Conselho Económico e Social publicou o Manual de linguagem inclusiva, que "pretende ser um guia facilitador da comunicação institucional do CES, inspirando-se em orientações normativas nacionais e internacionais quanto ao uso de uma linguagem inclusiva e promotora da igual visibilidade e simetria de mulheres e homens. Apresenta alternativas ao uso do universal masculino e várias sugestões que visam a inclusão de todas as pessoas que, por qualquer circunstância específica, devam ser mencionadas em documentos institucionais."?


Fundo documental | Ofertas

 







Sinopse da editora

A História Misteriosa de Portugal, de Victor Mendanha, publicado pela editora Pergaminho, é uma surpreendente viagem dentro da História de Portugal, com revelações e indagações bem fundamentadas, apesar do seu insólito, nomeadamente:
  • as verdadeiras razões que o Infante de Sagres tinha para querer contactar o Preste João; 
  • Bandarra não errou nas suas profecias e D. Sebastião regressará no início do próximo milénio; 
  • as provas de que Camões pertenceu à organização iniciática dos Iluminados; 
  • um arquiteto português viu a Atlântida e desenhou os edifícios do continente perdido.

👉A Biblioteca da Camilo agradece ao Senhor Luís Costa Ribeiro a oferta deste          livro.

      Boas leituras!


O fim da conversa de chacha

 











A COVID FEZ ESQUECER COMO SE FALA DE BANALIDADES SEM STRESSAR

O

truque — ensinaram-me há algum tempo — é não deixar cair a bola no chão. A bola tem de saltitar por todos. Simples. Para mim não era. Nunca foi. Não é. O desporto aqui descrito existe há dezenas de milhares de anos e chama-se “conversa de chacha”, aquela converseta que se tem com estranhos, semidesconhecidos ou pessoas pelas quais não temos grande interesse ou a quem nada nos ocorre perguntar mas com quem, por algum motivo, nos vemos a conviver numa determinada situação durante um curto período. Ora, o silêncio seria insuportável e bizarro. Ainda mais se estivermos a falar de uma festa, pelo que se desenvolveu essa técnica de “conversa de chacha”, que é a capacidade de vários seres humanos fingirem interesse no que os outros dizem e assim se irem questionando sobre um ramalhete de assuntos inofensivos (nem finanças, nem sexo, nem política, nem morte...), fazendo com que o tempo passe e ao longe pareça que estão a ter um convívio salutar e bem-disposto. Pode até não ser o caso. Seja como for, a “bola não pode cair”. Ou o grupinho cala-se — há uma sensação de “certo... pois...” — e, possivelmente, dispersa. Pois bem, isto que aqui foi descrito parece não ser nada de mais. Já os ingleses estão a levar muito a sério a possibilidade de a covid e os confinamentos terem ferido de morte a small talk, essa “cola da vivência em sociedade”. Para eles, isso é inconcebível, pois temem que tudo fique resumido ao silêncio ou “à ratoeira da meteorologia”, ao “e este tempo, hein?” — o grau zero da converseta. É uma questão civilizacional. Mas a coisa já vinha de antes das pandemias.

Inúmeros artigos em jornais de referência anunciam em pânico o perigo de extinção das conversas de circunstância devido à covid. Questionaram cabeleireiras e taxistas — doutores da prosápia sem GPS — e ouviram as respostas que seriam de esperar: sim, era verdade, ninguém queria já ter aquela conversa de rebeubéu, e os clientes afundavam a cabeça nos telemóveis. Uma tendência pré-covídica, alertaram os especialistas. Os humanos estavam a deixar de comunicar com estranhos, e mesmo entre eles, quando juntos, optavam por se conectar aos seus smartphones. Mas agora com a covid, e após um corte violento e obrigatório nas relações interpessoais, a questão é se muitos dos que tinham um domínio frágil dessas aptidões não as teriam perdido completamente. E se as devem reaprender. Os humanos podem deixar de saber comunicar entre si. Vejam o caso do melífago-regente (Anthochaera phrygia), o pássaro do sul da Austrália agora ameaçado de extinção que pura e simplesmente esqueceu o seu canto. Uma sonoridade única entre milhões de cantos de aves. Não tendo outros da sua espécie com quem aprender, começaram a mimetizar outros pássaros de outras espécies. A analogia, além de bonita, é que os humanos, ao não conviverem com os seus semelhantes, deixaram de saber fazer muitas das coisas que antes eram banais. Pareciam ser inatas. Mas não eram. Como o bate-papo sobre tudo e coisa nenhuma. De se sentir confortável sem máscara em grandes multidões ou se calhar saber ler as emoções faciais dos outros. A única coisa que sei é que há muita gente com ataques de ansiedade. Mas também pode ser da guerra, né? O resto são detalhes picuinhas. 

Na Inglaterra até se criaram “Programas de conversação transformacional”, visando ajudar a conversar relaxadamente com outros sobre assuntos banais, dado que a conversa informal sem rumo contribui para a nossa felicidade e retira-nos do isolamento e solidão. No curso ensina-se a fugir do “está tudo bem?” e do “que fizeste no fim de semana?” e o paradoxo que é conectar-se com outra pessoa — o que exige um certo esforço — e não retirar ganho efetivo nenhum daí. Mais: uma conhecida universidade inglesa de Direito decidiu oferecer um módulo de small talk aos estudantes devido à pandemia para que, ao tornarem-se advogados, tenham capacidade de conversar sobre coisas mundanas que não eles próprios, pois constataram que muitos deles sofrem de “síndrome floco de neve” (snowflakes), cada um acha-se único e irrepetível. É essencial que saibam conversar e acima de tudo ouvir. Mais? Até as cabeleireiras criaram uma associação — o Mindfullness Hairdressers — para tentar criar um momento único de interação humana com as clientes que queiram conversar. Bem sei, os ingleses e nós, nós e os ingleses, chilrear diferentes. 

Sempre tive uma grande incapacidade para a conversa de chacha nas festas. Pouco mojo para estar ali naquele “pois é, sim, claro, é isso, e você o que acha?”. E admiro verdadeiramente as pessoas que deliberadamente conseguem fazer que aqueles humanos que não se conhecem e talvez tenham pouco interesse em tal continuem a dizer coisas uns aos outros. São gestores de conversa de chacha e “a bola não cai”. Não o saberia fazer. Nem antes da covid. Talvez há umas décadas, quando não tinha mesmo noção de nada. Mas são exemplares de canto inato, pessoas que sabem lidar com os outros de forma natural, quando lidar com outros não tem nada de natural, digo eu. 

A minha opinião já está aí em cima. A conversa de chacha está condenada. O paradigma mudou. Somos melífago-regentes afónicos, agarrados à banalidade dos smartphones — nunca sós, sempre com 10 mil ou 100 mil amigos connosco na palma da mão, completamente autocentrados, incapazes cada vez mais de interagir e trocar meia dúzia de banalidades. Não é mau. Não é bom. É o que é. 

Luís Pedro Nunes. O mito lógico. Expresso Semanário#2600, de 26 de agosto de 2022

segunda-feira, 29 de agosto de 2022

As marcas de roupa estão a destruir a cabeça das miúdas (e das mulheres)

 







É como se estas marcas estivessem a dizer “a nossa roupa só pode ser usada por corpos perfeitos”. Há uma snobeira nestas marcas que acabam por fazer roupa para o instagram e não para a realidade, onde existem as mulheres e raparigas reais com corpos de diferentes tamanhos e que muitas vezes não têm vida para andar nos ginásios do lifestyle.



Luísa Sobral deixou um desabafo nas redes sociais que me interessa e que infelizmente é demasiado comum devido à tirania do corpo perfeito imposto pelas marcas de roupa que bombardeiam o espaço público (internet incluída). Como pai de duas raparigas, eu sinto este bombardeamento todos os dias. Por mais que diga que isso não é fundamental, que temos de nos sentir bem com o corpo que temos, que há vários tipos de corpo e que há beleza em cada tipo de corpo, sinto que perco todos os dias esta batalha, porque a imposição de um único modelo de corpo está literalmente no ar que se respira, está nas séries, nos cartazes, na publicidade, na internet e em muitas marcas/lojas de roupa, que, de forma inacreditável, fazem coleções com tamanhos cada vez mais pequenos.

Luísa Sobral, que está muito longe de ser uma mulher grande, comprou um fato de banho de uma marca portuguesa só para mulheres e em teoria só pensada e feita por mulheres. Comprou um M e não dava. Trocou para um L. Como a própria Luísa Sobral indica, isto não é um pormenor, é uma tirania cultural sobre o corpo das mulheres e sobretudo das raparigas, que depois acaba por ter efeitos na saúde mental - os distúrbios alimentares.

Como é que uma mulher normalíssima e a cair para o magro não cabe no M ou mesmo no L?, pergunta Luísa Sobral. Estas marcas, muitas vezes pensadas e costuradas por mulheres, só pensam num certo tipo de mulher? E as outras, não existem? Há aqui uma responsabilidade das marcas que vai muito além da venda de roupa; se colocam à venda um M e um L, então têm mesmo de ser um M e um L; caso contrário, estão apenas a desrespeitar as mulheres e a colocar macaquinhos na cabeça das adolescentes. Repare-se que ninguém está aqui a legitimar a obesidade, que é uma questão de saúde. O ponto aqui é criticar uma ideia errada e até perigosa: ser bonita é necessariamente ter um único tipo de corpo, o corpo instragram, o corpo tik tok.

É como se estas marcas estivessem a dizer “a nossa roupa só pode ser usada por corpos perfeitos”. Há uma snobeira nestas marcas que acabam por fazer roupa para o instagram e não para a realidade, onde existem as mulheres e raparigas reais com corpos de diferentes tamanhos e que muitas vezes não têm vida para andar nos ginásios do lifestyle. Isto não é só estética, é ética também: esta tirania do corpo perfeito lançada todos os dias sobre as raparigas cria um grave problema de saúde mental, criando ou agravando depressões, ansiedade crónica e distúrbios alimentares.

Henrique Raposo, Expresso, 29 de agosto de 2022



Dicionário da comunicação

 














'Um grupo de jornalistas portugueses escreve sobre comunicação de massas, elaborando o Novo Dicionário da Comunicação da Editora Chiado, outubro de 2015. São autores Alexandre Borges, Alexandre Luz, Gabriel Santos, Joana Valeriano, Madalena Botelho, Pedro Correia, Ricardo Coutinho, Rodrigo Moita de Deus, Rui Estrela, Salomé Serra, Sara Dias, Tiago Teixeira e Tomás Aranha; Luís Paixão Martins faz o prefácio. 

É uma obra dirigida a profissionais da comunicação social, estudantes desta área e todos aqueles interessados em fenómenos da comunicação social, do jornalismo, do marketing e da comunicação, no geral, sensibilizando-os para as novas terminologias que estão sempre a evoluir no mundo globalizado.'

O Novo Dicionário da Comunicação foi escrito sem o novo acordo ortográfico.


domingo, 28 de agosto de 2022

Cartazes dinâmicos colaborativos

 


Webinar Viriato | Cartazes dinâmicos colaborativos.



Capacitação Digital das Escolas

 





Módulos de Formação de Docentes desenvolvidos no âmbito do Programa de Digitalização para as Escolas

No sentido de disponibilizar novos recursos de referência para a preparação e dinamização das oficinas de formação desenvolvidas no âmbito do Programa de Digitalização para as Escolas, a Direção-Geral da Educação (DGE) disponibiliza Módulos de Formação de Docentes, desenvolvidos por diversos autores e pelos Centros de Competência TIC.

Para o seu desenvolvimento foram tidos em conta os vários níveis de proficiência digital dos docentes, bem como as áreas temáticas das oficinas de formação:

Com as diversas propostas de atividades e os recursos educativos sugeridos, pretende-se contribuir para a integração das tecnologias digitais nas práticas pedagógicas e também para o desenvolvimento das várias dimensões dos Planos de Ação para o Desenvolvimento Digital das Escolas (PADDE), de modo a que todos se sintam aptos a utilizar as tecnologias digitais nos diversos contextos educativos. 

Os Módulos de Formação de Docentes encontram-se disponíveis AQUI

O booktrailer - Um projeto, múltiplas aprendizagens

 





Neste vídeo assistimos à criação de booktrailers por parte dos alunos do Liceo Classico Chris Cappell em Anzio, Itália. Incentivados pela professora  iTEC (Innovative Technologies for Engaging Classrooms) Raffaella Fiorini, enquanto estudavam obras de literatura inglesa, produziram breves resenhas em formato de vídeo dos livros em estudo. 

A realização de um projeto desta natureza permite adquirir/desenvolver múltiplas aprendizagens:
  • conhecer melhor os livros que estão a ser lidos;
  • aprender os princípios da edição audiovisual;
  • trabalhar colaborativamente  com os colegas do grupo de trabalho;
  • adquirir /desenvolver capacidades baseadas em projetos.

Segundo Raffaella Fiorini, 

“Não é apenas o conteúdo narrativo; trata-se de despertar o interesse pelo livro em potenciais novos leitores. O objetivo é compartilhar as emoções. Isso está na escolha da música, das imagens, da edição do vídeo”.

Efetivamente, os alunos pesquisaram recursos multimedia, como vídeos, músicas e imagens estáticas, para usar como parte de seus booktrailers. Isso envolveu os alunos, que trabalharam autonomamente em pequenos grupos com uma orientação mínima da professora. Cada grupo tinha um blogue, onde os alunos podiam registar o seu progresso por meio de registos em vídeo, compartilhar os resultados e fornecer feedback a outros grupos. No final do projeto, cada grupo produziu uma biblioteca multimedia, contendo o trailer do livro e um mapa concetual do livro que tinham estudado.


Booktrailer elaborado sobre 1984, de George Orwell




Reveja alguns dos booktrailers produzidos pelos alunos da Camilo sobre as leituras realizadas na aula de Português:

Bichos, de Miguel Torga
O gato preto e outros contos, de Edar Allan Poe
O triunfo dos porcos, de George Orwell
A relíquia, de Eça de Queirós
Quando éramos mentirosos, de E. Lockhart.



sexta-feira, 26 de agosto de 2022

quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Tipos de avaliação educacional

 


Fonte:educationsaldia.com


















O objetivo da avaliação educacional é garantir níveis de formação que garantam a apropriação de uma série de habilidades, competências e conhecimentos específicos.


Revista | Comunicação & Educação

 



Vol. 27, nº1 | 2022
















Neste primeiro número do volume 27 da Comunicação & Educação foram publicados nove artigos científicos, uma recensão e uma entrevista com Guillermo Orozco Gómez. Para além destes textos, a revista da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo conta, também, com uma sugestão de atividades e “relatos de experiências envolvendo as incorporações” dos media nas escolas, de acordo com os editores Adilson Citelli, Claúdia Nonato, Roseli Fígaro.



Editorial

Ao longo das suas edições, a Comunicação & Educação busca fornecer subsídios para o melhor entendimento da comunicação no nosso tempo. E, nesta perspetiva, disponibiliza artigos, depoimentos e entrevistas de pesquisadores, docentes e profissionais que intentam pensar os reptos da comunicação, sobretudo naqueles diálogos com a educação e na cena em curso, na qual as tecnologias digitais passaram a jogar papel decisivo.

Neste número temos acesso a materiais educomunicativos que abrem o debate para os temas da aceleração tecnológica, dos reptos da cidadania, dos percalços postos ao meio ambiente, da censura, do audiovisual e da aprendizagem, do exame do protagonismo juvenil em vínculos com as histórias em quadrinhos e as propostas da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), assim como relatos de experiências envolvendo as incorporações dos media na escola. O artigo internacional apresenta a singular figura de Simón Rodríguez, um filósofo educador, mestre de Simón Bolivar, nascido na Venezuela, mas feito cidadão latino-americano, e que nos inícios do século XIX já apresentava um perfil de educomunicador, instituindo escolas-oficinas e projetos educativos pelos vários países nos quais viveu: Colômbia, Bolívia, Peru, Chile, Equador. Entrevistamos Guillermo Orozco Gómez, pensador mexicano de importante presença no contexto dos estudos de comunicação e comunicação-educação na América Latina. No rol dos textos apresentam-se, ainda, a seção literária e as proposições para o trabalho em sala de aula com o material que vem à luz neste número.

Da reflexão sobre os escritos nesta Comunicação & Educação, os problemas suscitados no início do Editorial podem ser retomados e aprofundados a fim de buscar-se uma comunicação mais inclusiva, capaz de abrigar as tecnodiversidades, segundo lembra Yuk Hui, e, sobretudo, conectada à educação emancipatória – mecanismo que registra potência para colocar sob suspeição as estratégias de vigilância e controle postas em andamento pelas big techs e derivadas.

Boa leitura!

Adilson Citelli, Cláudia Nonato e Roseli Figaro.


Ebook | 2º Encontro Internacional sobre Educação Artística





Os textos que agora se publicam correspondem aos textos reescritos após a sua apresentação no Encontro Internacional sobre Educação Artística (2ºEI_EA), realizado no Porto, de 2 a 4 de Abril de 2012, pelos respetivos autores. Era objetivo dos organizadores que o 2ºEI_EA se realizasse num ambiente de partilha de experiências e de debate aberto capaz de construir reflexões críticas decorrentes de cada ação. Partir para um encontro com a vontade de discussão implicava que todos os participantes aceitassem formas alternativas de questionamento que lhes permitissem um descentramento e um deslocamento dos lugares de conforto que cada um, inevitavelmente, vai ocupando. Terminado o encontro, foi lançado o convite, a cada interveniente, de reescrita do seu texto, tendo em consideração o debate ocorrido e, nomeadamente, as forças que se geraram e que atravessaram o seu pensamento. Os textos aqui reunidos são, assim, o resultado do novo desafio e respondem à vontade de partilhar, em formato digital, os textos que nos foram chegando. São publicados tal como enviados pelos seus autores, não tendo sido sujeitos a intervenção alguma pela comissão organizadora do 2ºEI_EA, mesmo do ponto de vista da sua organização gráfica. 


Ficha Técnica:
II Encontro Internacional sobre Educação Artística (2EI_EA)
Comissão Organizadora do 2EI_EA (org)
i2ADS – Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade (Editor)
Produção: Tiago Pinho


quarta-feira, 24 de agosto de 2022

1 livro, 1 filme | A Jangada de Pedra

 

#CentenárioSaramago




















Com diálogos em Espanhol e legendas em Português / 105 min.



Adaptação para cinema por George Sluizer, realizador holandês, do romance homónimo de José Saramago

Na sequência de um tremor de terra, que nenhum sismógrafo registou, abre-se uma fenda enorme ao longo da fronteira entre Espanha e França. Aos poucos, a Península Ibérica separa-se do continente europeu e parte à deriva no Atlântico, como uma gigantesca jangada de pedra. Portugueses e espanhóis veem o seu quotidiano abalado por essa nova realidade.
Antes do sucedido surgem sinais: Joana traça uma linha no chão que ninguém consegue apagar; o pescador Joaquim lança uma enorme pedra ao mar que desafia a gravidade e não se afunda; um bando de estorninhos acompanha José para todo o lado; num canto perdido de Espanha, Pedro é o único que sente a terra a tremer e da mão de Maria escapa-se um novelo que jamais termina.
Três homens, duas mulheres e um cão que o ocaso reuniu...ou talvez o destino, veem-se à deriva numa longa e imprevisível viagem. Os acontecimentos parecem ter apenas uma finalidade: fazer com que as pessoas se encontrem, desvendando pelo caminho inesperados enigmas.


Poderá (re)ver esta adaptação cinematográfica de A jangada de Pedra na RTP2, dia 28 de agosto, às 00:05.


📌 ... ou dirigir-se à Biblioteca da Camilo: o livro e o DVD estão disponíveis para consulta.



Fundo documental | Ofertas

 


 


 Sinopse da editora

Breve História da Europa - Da Grande Guerra aos nossos dias, editado pela 11x77, é um ensaio histórico sobre os principais acontecimentos que marcaram o continente entre 1917 e 2017, num olhar aguçado sobre as dinâmicas sociais de um século.

Do militarismo imperialista à Revolução Russa, da crise de 1929 à Segunda Guerra Mundial, do fim do pacto social à crise da União Europeia, passando pelas descrições empolgantes do Maio de 68 e da Primavera de Praga, Raquel Varela coloca o trabalho e as suas relações políticas e sociais no centro das grandes mudanças que ocorreram nos últimos cem anos.

Este é um livro que levanta questões provocadoras e que nos dá respostas sérias e rigorosas. Terá sido o Apocalipse da Segunda Guerra Mundial, o episódio mais brutal da história da Humanidade, com a perda de 80 milhões de pessoas - a resposta de uma classe suicidária à crise de 1929?

E o século XX, que começou (ainda que não oficialmente) em 1917, terá terminado em 1989 com a queda do Muro de Berlim, ou em 2008, com o fim do pacto social europeu?

 

👉 Os leitores da Biblioteca da Camilo agradecem ao Senhor Luís Costa Ribeiro a oferta deste livro.


terça-feira, 23 de agosto de 2022

Ebook | Filosofia e cinema

 













Nas últimas décadas assistimos a uma explosão sem precedentes na produção e no consumo de imagens. De alguns poucos retratos na parede e fotografias em álbuns de família, passando pela popularização do cinema, da televisão e do home video, e chegando aos milhares de fotografias e vídeos digitais produzidos pelos nossos smartphones e compartilhados em redes sociais e serviços de streaming, as imagens (estáticas ou em movimento) tornaram-se simplesmente omnipresentes nas nossas vidas. Como resultado de tal omnipresença, a nossa própria experiência da realidade está a tornar-se cada vez mais informada, mediada e sobredeterminada por imagens. Desse modo, o que até há pouco tempo atrás eram oportunidades para escapar da subjetividade e do isolamento, desfrutando uma realidade mais ampla e independente – reuniões com amigos e familiares, viagens, visitas a museus, etc. – agora estão-se a tornar cada vez mais ocasiões para emular, re-encenar ou aperfeiçoar outras tantas imagens dessas experiências, com as quais tivemos contacto em revistas, filmes, programas de TV, anúncios e assim por diante. Mesmo atividades corriqueiras, como uma simples caminhada no parque, podem tornar-se rotinas bem planeadas – roteirizadas, produzidas e encenadas, se não gravadas e editadas, e com direito a trilha sonora. De forma mais reveladora, até nos raros momentos em que decidimos não carregar nenhum tipo de dispositivo de registo fotográfico, muitas vezes vemo-nos não apenas a olhar para algo – uma paisagem, digamos – mas a pensar “que bela foto isso daria”, ou “como essa paisagem é cinematográfica”, e assim por diante. 

Mas isso não é tudo. Para além de moldarem a nossa experiência, as imagens às vezes parecem-nos mais reais do que a própria realidade. Para dar um exemplo simples, talvez a leitora ou o leitor compartilhem da sensação de um certo desapontamento ao entrarem em contacto pela primeira vez com uma famosa obra de arte - digamos, a Monalisa no museu do Louvre -, depois de terem visto tantas ampliações em alta definição ou mesmo acompanhado documentários inteiros dedicados a explorar todos os intrincados detalhes da produção e história dessa pintura. Experiências como essa, ao que tudo indica, têm-se tornado cada vez mais comuns, e têm levado alguns filósofos contemporâneos a proporem novas categorias concetuais com as quais procuram explicar esse fenómeno [1].

Adicionalmente, o cinema tem ocupado uma posição cada vez mais central como cânone da cultura contemporânea [2], no sentido de que é cada vez mais comum que filmes ou outras formas de narrativa audiovisual (como as séries de TV) cumpram a função de expressar e transmitir visões de mundo e da nossa condição humana que se tornam amplamente discutidas e, pelo menos nalguma medida, compartilhadas – sintoma disso é que é muito mais corriqueiro encontrarmos pessoas que se interessem pelos mesmos filmes ou pelas mesmas séries do que, por exemplo, pelos mesmos livros, ou pelas mesmas músicas. De facto, filmes e narrativas audiovisuais muitas vezes fornecem o primeiro e mesmo o único cânone efetivo para um grande número de pessoas, constituindo assim o ponto comum de referência para a avaliação de uma série de questões fundamentais relativas aos nossos valores, à nossa identidade, aos nossos costumes, à nossa moralidade, à nossa participação em sociedade, aos limites de nosso conhecimento, e finalmente, questões existenciais relativas à nossa finitude, à nossa mortalidade, e à busca humana por sentido. 

Por fim, é cada vez mais comum que os próprios filmes abordem problemas e temáticas de cunho ostensivamente filosófico. Apenas para citar alguns exemplos relativamente recentes e populares, qualquer espectador minimamente familiarizado com a filosofia é capaz de localizar o papel que certas imagens ou questões filosóficas desempenham na trama de filmes como os seguintes: 

Matrix, O Show de Truman, 13º Andar: tal como na República de Platão ou nas Meditações de Descartes, esses filmes convidam-nos a considerar a possibilidade de que a realidade inteira que experimentamos seja o produto de um embuste ou ilusão, uma espécie de sonho ou véu, e de que o descobrimento da realidade última de nossa vida, a matriz por trás desse véu, depende de se transcender a experiência humana quotidiana. 
Minority Report, Agentes do Destino, Gattaca, Westworld: esses filmes exploram questões envolvendo o livre arbítrio e a responsabilização moral, tais como: Estamos determinados a agir de certa forma (por determinação divina, cosmológica, genética, etc.)? Se estamos, podemos ser responsabilizados pelas nossas ações? 
O Resgate do Soldado Ryan e Batman – O Cavaleiro das Trevas: ambos os filmes estruturam-se implicitamente em torno do familiar debate metaético entre deontologia e utilitarismo, explorando, por exemplo, a questão de saber quando seria legítimo colocar a vida de muitas pessoas em risco em nome de uma só, porque “isso é a coisa certa a ser feita”, ou de saber em que situações (se é que em alguma) seria correto fazer concessões ao mal visando um bem maior. 
Blade Runner - O caçador de Andróides, O Homem Bicentenário, Eu Robô, Inteligência Artificial, Ela, Ex Machina: todos esses filmes, juntamente com uma série de outros exemplos de ficção científica cinematográfica, exploram questões tradicionalmente investigadas pela filosofia da mente, tais como: Podem máquinas ou sistemas digitais complexos pensar? O que é a mente? Qual é a natureza da relação mente/corpo? O que define o próprio ser humano? 

Não obstante a frequente aparição de imagens e questões filosóficas em filmes, esse facto não nos deve conduzir à falsa e simplificadora ideia que as relações entre cinema e filosofia se esgotam na tese de que o cinema ilustra ou explicita problemas filosóficos originalmente apresentados em outros meios. O cinema é muito mais do que um campo de experimentação de teses filosóficas ou uma arte a serviço da filosofia. Não há, nesse sentido, nenhum exagero em dizer que o advento do cinema redesenhou boa parte das feições tradicionais da filosofia. Ou, de todo modo, esta é uma tese que será explorada e defendida em várias das contribuições reunidas nesta coleção. 

Uma das pretensões centrais deste volume, nesse sentido, é justamente estudar a fisionomia que a filosofia adquire em contacto com o cinema, tomando o cinema não apenas como ferramenta didática que exemplifica e revela teses filosóficas, mas principalmente como um meio capaz de efetuar transformações no próprio modo como as questões da filosofia podem ser abordadas. Com isso, esperamos poder lançar luz sobre outros e novos aspetos da relação entre cinema e filosofia, alguns deles ainda pouco conhecidos na comunidade filosófica brasileira, e também pelos profissionais e amantes do cinema em geral. 

A ampliação do estudo das questões que a relação entre cinema e filosofia colocam e suas possibilidades de resposta começou a ser levada a cabo mais vigorosamente no final dos anos 80. No mundo de língua inglesa, essa abertura foi conduzida pelos ensaios precursores de filósofos como Stanley Cavell e, mais recentemente, Stephen Mulhall. No Brasil, o impulso para o estudo das relações entre cinema e filosofia deve muito ao trabalho precursor de Julio Cabrera [3]. A sugestão resultante desses seminais estudos filosóficos sobre o cinema é que a filosofia, tradicionalmente concebida como uma área restrita em termos de estratégias de “dizer o mundo”, de apreender as ambiguidades inerentes à condição moral ou metafísica humana, poderia encontrar no meio fílmico outras formas de exposição e apreensão de suas questões fundamentais. 

Essa afinidade foi sustentada em, pelo menos, três direções independentes: em primeiro lugar, no estilo da filosofia, uma vez que a diversidade das formas literário-narrativas que a filosofia pode assumir – desde o estilo argumentativo ou demonstrativo até às formas compreendidas no diálogo, nos sermões, meditações ou nos romances literários propriamente ditos –, é desafiada pela sétima arte, pela imagem em movimento, que pensa por si mesma e formula problemas de um modo que não é contínuo com outras formas de apresentação (argumentativas e não argumentativas) da filosofia. Mais do que uma linguagem que apoia a filosofia, o cinema é aqui uma forma de arte que redescreve a própria ideia da filosofia e dos seus objetos. 

Um segundo ponto relevante dessa interseção diz respeito à proximidade entre o cinema e a formação (em termos de estratégias de significação de si) do ser humano contemporâneo. O cinema é um objeto cultural e, como tal, incorpora perspetivas, formas de reflexão sobre a existencialidade e temporalidade muito particulares, guardando uma intimidade com a experiência individual. Pensado nessa direção, o cinema como objeto cultural e meio filosófico enriquece, a partir de seu nexo com a particularidade, com o tempo subjetivo e a individualidade, as pretensões universalizantes da filosofia. 

Por último, sendo o cinema não somente uma forma da arte, mas uma realidade, o “objeto-filme” também tem dado origem a questões ontológicas diversas: Qual a natureza do filme? Como é que essa natureza se articula com outros objetos da experiência? A filosofia do cinema toma-o como um ente e filosofa sobre este ente de maneira análoga à filosofia dos entes em geral. Neste caso, a filosofia é um meta-discurso ontológico sobre a relação entre as coisas tal como elas são e as coisas tal como elas figuram em filmes. Neste modo de entender, a filosofia do cinema não é uma parte da estética, mas uma metaphysica specialis sobre uma região do Ser, os entes cinematográficos. Esses diferentes direcionamentos, que estão longe de esgotar o repertório de temas e problemas que o advento do cinema possibilitou, ajudam a perceber como cinema e filosofia se retro-alimentam e, ao mesmo tempo, colocam desafios um ao outro enquanto modos cognitivos e artísticos de exploração da experiência humana.

Jônadas Techio, Flavio Williges (og.). Filosofia e cinema: uma antologia. Pelotas: NEPFIL Online, 2020. 482 p.[recurso eletrónico]


[1] O modo como a nossa percepção seria alterada pelas nossas tecnologias de reprodutibilidade já foi explorado por Walter Benjamin, no seu clássico ensaio “A Obra de Arte na Era de sua Reprodutibilidade Tecnológica”. De acordo com Benjamin: “Assim como todo o modo de existência dos coletivos humanos muda na passagem de longos períodos históricos, o mesmo ocorre com o seu modo de percepção. A maneira pela qual a percepção humana é organizada – o meio em que ela ocorre, é condicionada não apenas pela natureza, mas pela história.” (BENJAMIN, W. “The Work of Art in the Age of its Technological Reproducibility”, Selected Writings, Volume 4 1938–40, EILAND H. e JENNINGS, M. W. (Eds.). Cambridge, MA: Harvard University Press, 2003, p. 255. Ênfase no original.) Mais próximo dos nossos dias, Jean Baudrillard argumentou que a fotografia (e, posteriormente, o cinema) teriam levado à “morte da realidade”, tornando-se mais atraente e “mais real” que o próprio real; por isso ele propõe a noção de “hiper-realidade” para dar conta da nossa experiência contemporânea (ver BAUDRILLARD, J., The Perfect Crime, Verso Books, 2008, p. 87). Ver também SONTAG, S. “In Plato's Cave”. In On Photography. New York: Farrar, Straus and Giroux, 1977, p. 3-24.

[2] Esse ponto é melhor desenvolvido na Introdução de COX, D. e LEVINE, M. P. Thinking Through Film: Doing Philosophy, Watching Movies. Wiley-Blackwell, 2011.

[3] Sobre a visão de Cabrera acerca das relações entre cinema e filosofia, ver o capítulo “Cinema e Filosofia: para uma crítica da razão logopática” em CABRERA, Julio. O cinema pensa: uma introdução à filosofia através dos filmes. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.