Foi a primeira vez que Portugal participou no estudo da OCDE que avalia a literacia, numeracia e capacidade de resolução de problemas entre a população adulta (16-65 anos) e os resultados estão longe de ser positivos. Em qualquer uma das áreas avaliadas, a média alcançada ficou muito aquém da OCDE e, numa comparação com vários países europeus e os EUA, o país apresentou um dos piores resultados, mostram os dados agora revelados.
O Estudo sobre as Competências entre Adultos de 2023 foi feito a partir de entrevistas e de uma espécie de teste realizado por uma amostra de 3160 adultos, representativa dos 6,6 milhões de residentes em Portugal entre os 16 e os 65 anos. Os exercícios propostos testavam a capacidade de interpretar textos e extrair informação, entender e manipular números e resolver problemas a partir de determinados dados, tudo isto aplicado a situações que podem ocorrer no dia-a-dia. O grau de acerto ou de erro determinou a atribuição de um valor, numa escala de proficiência até aos 500 pontos.
Tudo somado, concluiu-se que existe uma elevadíssima percentagem de portugueses que não vai além dos níveis mais baixos de proficiência, independentemente da área avaliada. Ou seja, não são capazes de executar com sucesso as tarefas mais complexas propostas.
Na literacia, 42% dos adultos em Portugal atingiu no máximo o nível 1, o que significa que “conseguem compreender pequenos textos e organizar listas quando a informação está claramente indicada ou entender apenas frases simples”, por exemplo. Esta percentagem de população com “baixa literacia” é o dobro da média da OCDE.
No extremo oposto da escala estão os 4% de adultos (12% na OCDE) que conseguem desempenhar com sucesso as tarefas mais complexas, que implicam interpretação de textos densos e longos e fazer extrapolações.
Na numeracia, as percentagens de baixa proficiência (abaixo ou até ao nível 1) encontradas foram de 40% em Portugal contra uma média de 25% na OCDE. Esta população não consegue resolver problemas que impliquem vários passos até à solução ou que impliquem considerar múltiplas variáveis.
Quanto à resolução de problemas, o cenário não melhora, com as percentagens de residentes a revelar não mais que capacidades básicas a atingir os 42% em Portugal, contra uma média de 29% na OCDE.
Numa escala até 4 ou mais e juntando todas as literacias, o estudo conclui que 30% dos adultos em Portugal não vão além do nível 2, revelando grandes limitações na resolução de tarefas de maior complexidade. A média da OCDE é de 18%.
O peso das baixas qualificações
Entre os residentes em Portugal, os desempenhos não são todos iguais e encontram-se diferenças significativas entre a performance do grupo 25-34 e dos 55-65, com claro prejuízo para este último. A diferença não causa surpresa, sabendo que em todos os países níveis mais altos de qualificação académica estão associados a maior proficiência em qualquer literacia. E Portugal, apesar da recuperação que tem vindo a ser feita, continua a ter uma população adulta com baixos níveis de escolarização.
Ainda assim, o relatório também nota que existem diferenças entre países, mesmo quando se comparam os grupos mais qualificados. Quem frequentou o ensino superior em Portugal obteve, em média, resultados mais baixos nestes testes do que quem apenas tem o ensino secundário completo na Finlândia.
Além do desenvolvimento pessoal, o estudo encontrou associações positivas entre níveis mais altos de proficiência e o estado de saúde, a satisfação com a vida, participação política e confiança.
Globalmente e entre os países participantes no estudo da OCDE, Finlândia, Japão, Países Baixos, Noruega e Suécia estão entre os que obtiveram melhores resultados. Portugal está, a par de França ou Itália, por exemplo, entre os 11 países com médias consistentemente abaixo da OCDE nos três domínios avaliados.
Esta foi a segunda vez que a OCDE realizou um grande estudo sobre as competências da população adulta e a sua capacidade para ser bem sucedida num "mundo em mudança". A primeira edição do estudo realizou-se há 10 anos. A segunda edição devia ter acontecido em 2021/22, mas foi adiada para o ano seguinte por causa da pandemia.
Isabel Leiria, Expresso, 11 de dezembro de 2024