O genocídio dos judeus tornou-se símbolo universal do mal, mas o dos sintis e romas, tal como agora o dos palestinianos, permanece largamente invisível.
No dia 2 de agosto de 1944 as SS assassinaram os últimos 4300 sintis e romas no campo de concentração de Auschwitz-Birkenau. Em 2015, mais de 70 anos depois, a data foi oficialmente reconhecida pelo Parlamento Europeu como Dia Europeu da Memória do Holocausto dos Sinti e Roma.
Não se conhece com exatidão a dimensão do Porajmos, o genocídio dos sintis e romas durante o regime nazi. Estima-se que tenha culminado no assassínio de até 500 mil pessoas em toda a Europa. Estas pessoas foram sistematicamente privadas de direitos, deportadas, exterminadas. Nos campos de concentração de Dachau e Flossenburg centenas sofreram em condições desumanas.
Durante décadas, o extermínio dos sintis e romas foi tratado como uma nota de rodapé da História. Uma tragédia menor numa tragédia maior. O anticiganismo persistiu após a guerra, dificultando o reconhecimento das vítimas e a sua integração na narrativa oficial do Holocausto. Só em 1982 a Alemanha, através do chanceler Helmut Schmidt, reconheceu oficialmente o genocídio dos sintis e romas como “genocídio por motivos raciais”.
Em julho, teve início um novo estudo sobre as comunidades ciganas em Portugal. Uma das cocoordenadoras, Inês Barbosa, revelou, em entrevista ao “Público”, que o anticiganismo está a aumentar entre nós. Embora a situação já fosse preocupante há dois anos, quando foi avaliada a Estratégia Nacional de Integração das Comunidades Ciganas 2013-2023, deteriorou-se significativamente.
A memória seletiva das tragédias revela como privilegiamos certas vítimas em detrimento de outras. Construímos hierarquias da compaixão que refletem os preconceitos do presente. O genocídio dos judeus tornou-se símbolo universal do mal, mas o dos sintis e romas, tal como agora o dos palestinianos, permanece largamente invisível.
Esta invisibilidade permite a continuação da discriminação. Em Portugal os números são brutais. Segundo dados da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia, 62% dos ciganos portugueses sentiram discriminação em 2021. No acesso ao emprego 81% e no acesso à saúde 32%. Nestas três áreas Portugal apresenta a percentagem mais alta dos 10 países analisados. A taxa de risco de pobreza atinge 96%.
Os ciganos continuam a ser vistos como o “outro” inassimilável, perigoso, indesejável. Os mesmos estereótipos que alimentaram o genocídio nazi persistem nas sociedades democráticas. Os investigadores notam, com preocupação, que não só o Chega, mas também outras forças políticas, podem estar a contribuir para retrocessos. Por todo o país as comunidades ciganas manifestam receio face às próximas eleições autárquicas, temendo o cancelamento de projetos e a paralisação ou reversão de processos de realojamento.
A memória do Porajmos exige mais do que um dia comemorativo. Exige justiça presente para os seus descendentes, porque a História só serve se nos ensinar a não repetir.
Teresa Violante, Jornal Expresso, 14 de agosto de 2025
O Dia Europeu em Memória dos Ciganos Vítimas do Holocausto assinala-se todos os anos a 2 de agosto.
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