V9/04 | Dezembro 2021
Download |
Feliz Natal e Bom Ano Novo… com bactérias!
O termo enzima [1] foi definido pela primeira vez por Wilhelm Kühne em 1867 e o seu estudo proporcionou 37 prémios Nobel nos campos da Química e da Medicina. Enzimas são proteínas, macromoléculas espantosas que funcionam como catalisadores biológicos, com uma aplicabilidade cada vez maior à nossa vida, tal como a vivemos. As enzimas existem no organismo humano mas também existem noutras espécies, como sejam as bactérias, e, tanto umas como outras, ocupam o seu lugar na nossa sociedade.
Há inúmeros exemplos da aplicação de enzimas nas indústrias alimentar, têxtil, papel, detergentes, química, biocombustíveis e saúde.
A indústria farmacêutica é uma das que mais beneficia da utilização de reações enzimáticas como precursores de antibióticos, ou em quimioterapia ou, ainda, em substituição, por exemplo, de complicadas vias sintéticas. Uma percentagem muito considerável dos fármacos existentes são, na realidade, inibidores de enzimas.
Recentemente, foi reportada uma notícia muito interessante em Itália que, como sabemos, tem variadíssimas cidades com ruas repletas de antiguidades maravilhosas que encantam todos os viajantes que as percorrem. Mas todas estas antiguidades estão sob o perigo constante da poluição que ameaça destruí-las gradualmente. Para enfrentar a poluição devastadora, está a ser utilizada uma tecnologia nova que emprega enzimas bacterianas que, ao cobrirem os mármores antigos, depositam sobre eles carbonato de cálcio, resultando numa calcificação natural do mármore das antiguidades. Exemplos de sucesso da utilização desta nova tecnologia são o Arco de Septímio Severo, no Forum Romano, e a Capela dos Médici, em Florença, esta última desenhada pelo famoso Michelangelo no século XVI. É espantoso pensar que, cada vez mais, os trabalhos de restauração estão a ser realizados a um nível molecular.
Numa das edições da revista Science, de 2021, foi reportada a descoberta da bactéria Ideonella sakaiensis 201-F6, que tem a particularidade de crescer no plástico PET (tereftalato de polietileno), utilizando-o como fonte principal de energia e carbono. O PET é o plástico mais utilizado na produção de garrafas que todos usamos diariamente... infelizmente... Esta estirpe bacteriana produz duas enzimas, PETase e MHETase, ambas necessárias para converter o PET em dois monómeros, o ácido tereftálico e o etilenoglicol — os compostos a partir dos quais o PET é sintetizado, os dois ambientalmente benignos. Assim, fica constituído um ‘ciclo enzimático verde’ segundo o qual ambas aquelas enzimas degradam o PET nos seus constituintes naturais, o ácido tereftálico e o etilenoglicol. A MHETase é um dos temas abordados nesta edição.
E a capa desta edição retrata uma plantação de algodão, onde o uso de bactérias substituiu o habitual de pesticidas!
Em conclusão, as bactérias têm uma reputação injusta na medida em que são prioritariamente associadas a infeções, embora as suas funções sejam muito mais complexas, dado que apenas um número muito pequeno de bactérias é patogénico. Na realidade, mais de 95% das bactérias não são nocivas para os humanos que vivem no meio delas e graças a elas!
[1] Em português, o termo enzima é utilizado indiscriminadamente como sendo feminino ou masculino.
Maria João Ramos
Editora convidada
📗 Versão impressa disponível na Biblioteca.
Sem comentários:
Enviar um comentário