quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Os outros não fazem nada




Greta Thunberg



José Miguel Leonardo
Tech & Touch | Semanário Expresso



S
entado no sofá fazia zapping aos vários canais de notícias. Uma vergonha, os incêndios que voltaram, os plásticos que matam as diferentes espécies, o dinheiro público que não chega para sustentar o Estado social. Enquanto via e ouvia cada reportagem revoltava-se, comentava em voz alta como era possível que ninguém fizesse nada, que o Governo não atuasse, que os políticos não legislassem, que as empresas não fizessem de forma diferente. Incomodava-o a inércia, o não fazer certo e questionava-se frequentemente porque é que eles não agiam de outra forma

E assim foi. Todos os dias, numa vida de rotina, sempre a apontar o dedo, sentado no mesmo sofá ouvindo diferentes canais e criticando os outros que não mudam de atitude, que não garantem a mudança. Como era possível que não se fizesse nada? E ele continuava, todos os dias a fazer o mesmo, porque afinal são os outros que não fazem, essas entidades poderosas que parece que não são feitas de pessoas e que só elas são responsáveis pela mudança. Ele nunca trocou a televisão por um espelho, nunca percebeu que um não é igual a zero. Que não comprar palhinhas de plástico é um começo, que separar o lixo é ajudar o planeta e que a mudança começa sempre no individual, nas mais pequenas coisas. Ele que se revoltava quando era obrigado a alterar a sua rotina, que reclamava no trabalho em conversas de corredor porque lhe queriam alterar os processos ou porque simplesmente lhe pediam mais iniciativa.
Porque é que o havia de fazer? Era apenas um. A a culpa era do ‘chefe’ da empresa, do mercado que estava a decair e de determinadas pessoas. A culpa era daqueles que estavam sempre a perguntar porquê, que questionavam e testavam novas formas e que não percebiam que não valia a pena mudar. Aqueles que teimavam em não arranjar desculpas e que continuavam a tentar, subindo ladeira acima, com o vento pela frente, não desistindo do seu objetivo e mantendo o propósito que os fazia querer chegar sempre mais longe.
E ele, à noite no sofá, percebia que só sabia queixar-se. Fazia-o baixinho, ganhando cabelos brancos e aumentando a sua infelicidade. Só ficava em silêncio, sem palavras, quando via Greta Thunberg, aquela adolescente sueca que teve a coragem de agir em prol de um mundo melhor! Um igual a um, enquanto que ele era igual a zero.
Diretor-Geral da Randstad Portugal
Expresso, 3 de agosto de 2019 

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