Neste dia 23 de agosto honramos a memória dos homens e das mulheres que, em 1791, em São Domingos, se revoltaram e abriram o caminho para o fim da escravatura e da desumanização. Honramos a sua memória e a de todas as outras vítimas da escravatura que eles representam.
A luta contra o tráfico e a escravatura é universal e intemporal. É por esta razão que a UNESCO envidou esforços para lançar o Dia Internacional da Recordação do Tráfico Negreiro e da sua Abolição. Este dia especial reconhece a importância da luta daqueles que, submetidos à negação da sua própria humanidade, triunfaram sobre o sistema da escravatura e afirmaram a universalidade dos princípios da dignidade humana, da liberdade e da igualdade.
O horror da escravidão faz-nos refletir e questionar a humanidade. A escravidão é o resultado de uma conceção racista do mundo que desvirtua todos os aspetos da atividade humana. Esta visão do mundo, estabelecida como um sistema de pensamento e ilustrada nos mais variados tipos de obras filosóficas e artísticas, tem sido a base de práticas políticas, económicas e sociais, de alcance e consequências mundiais, que se reflete ainda hoje em discursos e atos de violência, não isolados, e que estão diretamente ligados a esta história intelectual e política.
Para que possamos tirar lições da história, temos de deslindar este sistema, desconstruir os mecanismos retóricos e pseudocientíficos utilizados para o justificar e devemos recusarmo-nos a aceitar qualquer concessão ou apologia que por si só comprometa os princípios. Tal lucidez é o requisito fundamental para a reconciliação entre a memória e a luta contra todas as formas atuais de escravidão que continuam a afetar milhões de pessoas, particularmente mulheres e crianças.
O ano de 2019 é particularmente importante para este Dia Internacional. É altura de se fazer um balanço e adotar novas perspetivas, a meio da Década Internacional de Afrodescendentes (2015-2024), proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas para incentivar os Estados-Membros a aplicarem estratégias de luta contra o racismo e a discriminação.
Este ano marca igualmente o vigésimo quinto aniversário do Projeto “A Rota do Escravo: Resistência, Liberdade, Património” da UNESCO. Ao longo de um quarto de século, a Organização tem trabalhado para ajudar os governos, as universidades, os media e a sociedade civil a examinarem este trágico capítulo da nossa história não só para combater a ignorância e a negação de um passado que, apesar de tudo, foi extensamente documentado, de forma escrita, oral e material como para dar a conhecer este património em toda a sua complexidade. Neste aniversário, os holofotes estão voltados para Benim, onde o projeto foi lançado em 1994, e onde o Comité Científico Internacional para o Projeto “A Rota do Escravo” será convidado a fazer um balanço do trabalho feito e a propor novas perspetivas de acordo com o mundo atual.
Por último, 2019 é o ano em que o Gana celebra o “Ano do regresso” e os laços históricos do país com a diáspora africana, um reconhecimento que assinala o 400º aniversário da chegada dos primeiros escravos africanos à colónia inglesa de Jamestown.
Todas estas celebrações encorajam-nos a continuar a reunir esforços para pôr um fim definitivo à exploração humana e para garantir que a memória das vítimas e dos que lutaram por esta liberdade continue a ser uma fonte de inspiração para as gerações futuras.
Audrey Azoulay
Sem comentários:
Enviar um comentário