quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Trinta Clássicos das Letras|27. O Poder e a Glória, de Graham Greene




Graham Greene





O Poder e a Glória foi publicado em 1940 e constitui uma reflexão muito séria sobre o compromisso cristão.
No final dos anos trinta, Graham Greene (1904-1991), então jornalista, foi enviado ao México para avaliar naquele país a situação das perseguições religiosas na região central, derivadas da “guerra cristera”, especialmente nos estados de Tabasco e de Chiapas e em Laredo. Dessa viagem resultou um relato intitulado The Lawless Road e depois este extraordinário romance. Aqui se narra a perseguição a um padre fugitivo feita por um tenente fanático que deseja capturá-lo sob a pressão do governador da província.
O relato remete-nos para a lembrança das perseguições dos primeiros cristãos e tem como paradigma nas suas duas faces a figura de Paulo de Tarso, como perseguidor e como perseguido, na Estrada de Damasco. O perseguidor, o tenente, qual fariseu intolerante, consegue a autorização para matar o padre que protagoniza o romance. Finalmente preso, após percorrer fazendas e povoados, o sacerdote é executado para a satisfação do tenente. Mas este clérigo é um pobre homem que vive dominado pelo álcool e que tem um filho para cuidar. Ele tenta fugir, mas o dever e a misericórdia chamam-no sempre que alguém pede o seu auxílio.
Como afirmou François Mauriac, que não poupou elogios ao romance, que considerou ser uma obra-prima: “mesmo quando crê que a sua ajuda é vã, e não ignora que é de uma emboscada que se trata e que aquele que o chama já o traiu, este padre bêbedo, impuro, que treme perante a morte, dá a sua vida sem perder em nenhum momento o sentimento da sua baixeza e da sua vergonha”. O drama de O Poder e a Glória corresponde, assim, a um relato dramático em que a Graça e o Pecado se encontram e desencontram – uma vez que o romancista britânico nos diz que é na situação limite e no afrontamento do mal que a Graça se manifesta. Muitos não o compreenderam, porém, mas o tempo veio a revelar que o livro se tornou uma referência do nosso tempo – colocando-nos no centro da dúvida e da fé.
De que vale ficarmo-nos apenas na comum normalidade? É preciso interrogarmo-nos sobre a essência das coisas, o que obriga a ir até às fronteiras onde os sentimentos, as virtudes e o pecado se encontram. A samaritana surpreende-se por encontrar Cristo àquela hora na fonte. Muitos se escandalizam… Tal como no drama do México, perante a perseguição e a incerteza, devemos lembrar, por exemplo, o caso de Thérèse Desqueiroux, em que François Mauriac também afronta a humanidade pelo lado da presença constante de um confronto de resultado incerto entre o bem e o mal. A Graça e a liberdade encontram-se e não se anulam. Como disse Paul Henri Simon: «Mauriac engendra um outro trágico, mais complexo e mais moderno, do homem que age e que luta, suspenso entre duas eternidades, do nada e da salvação, entre o infinito deserto e a plenitude infinita do amor, sem que saibamos por que lado se deixará levar…».
Greene sentiu a atração emocional pelo catolicismo no México, perante uma Igreja proscrita com os seus crentes perseguidos. “Vi os índios descerem das montanhas e entrarem nas igrejas, onde tentavam recordar os velhos ritos”. Além do culto do paradoxo, é a recusa do tédio que o levou a escrever, do mesmo modo que as injustiças lhe trouxeram os temas. “As injustiças de que me apercebo não me encolerizam (repetia tantas vezes); antes melhoram os meus poderes de observação. A distância é um dos requisitos da boa literatura”. E é a melhor literatura que encontramos neste romance muito intenso e duro, imortalizado por Henry Fonda em “The Fugitive”, de John Ford (1947), que transpôs para a tela o extraordinário romance de Graham Greene. Se nos lembrarmos de novo de Steinbeck e de As Vinhas da Ira, é um outro lado da paixão bíblica que encontramos…

Agostinho de Morais
Raíz e Utopia, Centro Nacional de Cultura, 27 de agosto de 2019



📹 Veja extratos da adaptação do romance ao cinema, por John Ford:


Tributo a John Ford, o protagonista de O Fugitivo (1947).
A música/hino é do CD de Gordon Berry, "The Potters House - Broken Pieces".




Please draw me, oh Lamb
(Frail as I am)
Lead me to Calvary

You laid down your life,
In all of your strife
Your love revealed at Calvary

Please draw me, oh Lamb
(Frail as I am)
Lead me to Calvary

On the cross, broken breath
Shimmering cup, filled with dread
Your communion at Calvary

Please draw me, oh Lamb
(Frail as I am)
Lead me to Calvary

Take His body, eat the bread
Drink the wine that He's bled
He lives now in you and me

Redeemed by the Lamb
Precious Saviour, great I am
I am the child of the lion and the lamb

I come, precious Lamb
(Frail as I am)
Transform me at Calvary

I come, precious Lamb
(Frail as I am)
Transform me at Calvary

Please draw me, oh Lamb
(Frail as I am)
Lead me to Calvary

I come, precious Lamb
(Frail as I am)
Transform me at Calvary


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