domingo, 11 de agosto de 2019

O silêncio é de oiro









Ó menina não me faça perguntas, tire lá daqui o microfone, não insista. E lá volta ela

O que é que eu sou? Sou um homem sem opiniões daquelas que a menina gosta de ouvir e depois passa na televisão e foi o seu programa ou lá o que seja. Não é?
Se não tenho opinião sobre nada? Pronto, então vamos lá a ver: até tenho. Olhe tenho-as fresquinhas todos os dias pois troco-as com as minhas vacas quando as levo ao monte ou a dar-lhes de beber ou a levá-las a dormir ou quando as acordo. Quer saber? Não quer saber? Mas eu digo

A minha opinião de hoje - aquela fresquinha que troquei com a Eulália, esta vaca que aqui vê e que me dá grandes alegrias pelo leite que faz meu pão - foi a seguinte

A minha vaca não quer ser europeia e eu também não quero que ela seja. Está no seu direito, ou não? E eu também, ou não? Ela é corajosa mesmo quase calada. É tão corajosa como eu quando digo com firmeza à menina que é precisa coragem para não ter opiniões. A menina consegue? Ah! pois é, até fica muda. Mas olhe, que se conseguir não ter opiniões, ou, tê-las frescas como a minha Eulália me ensina, olhe que no seu caso, se for capaz, ainda vai parar a um cargo bom. Aqui ou na Europa. Sou eu que lho digo. Mas olhe que é preciso que esteja muito tempo caladinha e não pergunte o que não quer ouvir.

Ainda há uns dias voltei a lembrar-me que o silêncio é de oiro. Ora veja o preço dele aqui em Ponte de Lima. Mas viu, viu, como já lhe respondi, já não consigo ser rico proximamente. Temos que falar para dentro e por isso eu não lhe queria dizer nada, já que, acredite, a maioria das vezes não tenho opinião e acho que até é bom para o país que não exista mais um palavroso. Entende? E muito menos que fale também em nome de outro, neste caso outra, como foi o caso da minha Eulália. Prometi-lhe e agora descaí-me com a opinião dela também.

Pois com licença, cá vou à vida que já pequei e que a sua já está feita, ao menos por hoje.

Eulália? Tens a certeza que tens sede? Ou é só para conversar? Pronto a tua mãe vai connosco também. O que é um rumo? Olha é eu andar ao teu passo e aguardar há anos consulta para a dor nas cruzes. Pensa bem, tens opinião sobre quem quer ser um de nós?

Pois. Eu também fui sempre assim, como sabes. Seria bom que, por uma vez…

Pois.

Teresa Bracinha Vieira
Raíz e Utopia, Centro Nacional de Cultura, 8 de agosto de 2019



Sem comentários: