No contexto de mudança e incerteza quanto ao futuro a “Secção de Leitura e Literacia está atualmente a concentrar-se na Leitura para o Bem-Estar. Este assunto tem sido o nosso foco principal nos últimos dois anos e atualmente estamos a planear iniciativas e programas em torno de Biblioterapia, Leitura Partilhada, Leitura Consciente e Contar Histórias”, afirma Atlanta Meyer, Presidenta da Secção de Leitura e Literacia da International Federation of Library Associations and Institutions (IFLA) [1], cujas diretrizes são seguidas pela Rede de Bibliotecas Escolares.
Uma das primeiras definições de biblioterapia diz que esta é “um processo de interação dinâmica entre a personalidade do leitor e a literatura, de carácter psicológico e que contribui para o ajustamento e desenvolvimento do ser humano” (Caroline Shrodes, 1949) [2].
De acordo com a pesquisa de “bibliotherapy” em ODLIS: Online Dictionary of Library and Information Science, pode ter 3 fases:
1. Diagnóstico do problema e interesses de leitura do paciente e recomendação de material de leitura pelo terapeuta com decisão de textos a ler por aquele.
2. Durante a leitura, o leitor percebe como (pelo menos) um dos personagens resolve os seus desafios e identifica-se com ele, facilitando a catarse. Podem ser propostos exercícios de leitura como seleção de frases significativas, formulação de perguntas, escrita de outro final da narrativa, ilustração, dramatização...
3. Reflexão crítica e diálogo com o terapeuta sobre a relevância da solução sugerida pelo texto e que pode dar azo ao aprofundamento da partilha da história pessoal e à mudança.
A American Library Association disponibiliza recursos que apoiam a formação em biblioterapia e “para ajudar crianças em tempos de dificuldade” em idioma inglês [3]. A Rede de Bibliotecas Escolares disponibiliza, em português, álbuns gráficos que podem ser ponto de partida para falar sobre temas difíceis como igualdade de género, racismo e discriminação, bullying, homossexualidade, guerra e doença mental [4].
A biblioterapia é uma abordagem terapêutica que usa sobretudo literatura ou livros de ficção - metáforas e símbolos dão azo a projeção de sentimentos e ideias - mas também textos de não ficção como filosofia, memórias ou desenvolvimento pessoal, para tratar problemas de saúde mental como ansiedade, depressão e traumas, bem como consumos e dependências e pode ser complemento à psicologia e psiquiatria tradicionais.
Esta terapia pode desenvolver-se em sessões individuais ou em grupo e nelas pretende-se que o leitor compreenda outras perspetivas, desenvolva empatia percebendo que o problema é comum a outras pessoas e experimente sentimentos de autoestima/ eficácia e contentamento.
Pode ser desenvolvida com apoio de terapeutas especializados, mas não sendo, não se conhecem efeitos prejudiciais e pode ser sobretudo útil para pacientes com problemas moderados, pouco tempo e dinheiro. A International Federation for Biblio/Poetry Therapy é uma das instituições que estabelece diretrizes para biblioterapia e certifica estes profissionais.
Tal como a cinetarapia e a musicoterapia, também a biblioterapia é uma área que pode ser aprofundada pelos bibliotecários. A compreensão e experiência que têm de análise do comportamento humano, de livros e materiais de leitura e abordagens que geram envolvimento e discussão facilita esta oportunidade que conhece cada vez mais adeptos no âmbito de uma estratégia holística de cuidados de saúde que favorecem o bem-estar.
Também pode ser trabalhada em contexto de educação para a cidadania que visa aprender a colocar-se no lugar do outro numa lógica, não só de tomada de consciência dos próprios direitos, como de cumprimento dos deveres associados para que todos os direitos humanos sejam maximamente exercidos no espaço público [2].
Perspetivando o futuro da leitura em contexto da biblioteca, Atlanta Meyer identifica outro desafio: “Ler é divertido! A leitura aproxima as pessoas, acende a imaginação, desenvolve a criatividade e proporciona um sentimento de pertença. Sabemos da importância e benefícios da leitura e como promovê-los, mas não sabemos como promover a leitura por diversão e acho que é por aí que devemos começar.”
Gostaríamos de ouvi-lo sobre como promover o bem-estar e a diversão através da leitura…
Referências
1. (2022, 22 Apr.). In conversation with: Atlanta Meyer, Chair, Literacy and Reading Section. Netherlands: IFLA. https://www.ifla.org/news/in-conversation-with-atlanta-meyer-chair-literacy-and-reading-section/
2. Nobre, S. (2022, 14 fev,). Contributos da Biblioterapia para a Cidadania. A biblioterapeuta. https://abiblioterapeuta.com/2022/02/14/contributos-da-biblioterapia-para-a-cidadania/
3. American Library Association. (2022). Bibliotherapy. USA: ALA. https://www.ala.org/tools/atoz/bibliotherapy
4. Rede de Bibliotecas Escolares (2019). Álbuns gráficos para o desenvolvimento. Portugal: RBE. https://www.rbe.mec.pt/np4/2079.html
5. Imagem de Astrid Pereira por Pixabay
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