segunda-feira, 25 de junho de 2018

Aprendimentos







O filósofo Kierkegaard me ensinou que cultura

é o caminho que o homem percorre para se conhecer.

Sócrates fez o seu caminho de cultura e ao fim

falou que só sabia que não sabia de nada.

Não tinha as certezas científicas. Mas que aprendera coisas

di-menor com a natureza. Aprendeu que as folhas

das árvores servem para nos ensinar a cair sem

alardes. Disse que fosse ele caracol vegetado

sobre pedras, ele iria gostar. Iria certamente

aprender o idioma que as rãs falam com as águas

e ia conversar com as rãs.

E gostasse mais de ensinar que a exuberância maior está nos insetos

do que nas paisagens. Seu rosto tinha um lado de

ave. Por isso ele podia conhecer todos os pássaros

do mundo pelo coração de seus cantos. Estudara

nos livros demais. Porém aprendia melhor no ver,

no ouvir, no pegar, no provar e no cheirar.

Chegou por vezes de alcançar o sotaque das origens.

Se admirava de como um grilo sozinho, um só pequeno

grilo, podia desmontar os silêncios de uma noite!

Eu vivi antigamente com Sócrates, Platão, Aristóteles —

esse pessoal.

Eles falavam nas aulas: Quem se aproxima das origens se renova.

Píndaro falava pra mim que usava todos os fósseis linguísticos que

achava para renovar sua poesia. Os mestres pregavam

que o fascínio poético vem das raízes da fala.

Sócrates falava que as expressões mais eróticas

são donzelas. E que a Beleza se explica melhor

por não haver razão nenhuma nela. O que mais eu sei

sobre Sócrates é que ele viveu uma ascese de mosca.

Memórias Inventadas, As infâncias de Manoel de Barros.

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