terça-feira, 29 de dezembro de 2020

O futuro do futuro

 

Inteligência artificial quântica para formular a Teoria de Tudo








Os físicos acreditam que até ao fim do século um computador será capaz de formular uma teoria unificadora de todas as leis da Física, mas os seres humanos podem não a compreender.



A (falta de) caracterização da matéria escura e da energia escura, que são a maior parte do universo, intrigam a comunidade científica. Acreditamos que temos hipóteses de sondá-lo usando a tecnologia quântica.” Maria Spiropulu, investigadora do Instituto de Tecnologia da Califórnia, confirma, em declarações ao Expresso, a possibilidade levantada por Stephen Hawking, em 1980, segundo a qual seriam os computadores a completar a Teoria de Tudo. Não será para cedo, mas alguns físicos acreditam que a meta vai ser cortada algures no final do século.

Falta fechar o círculo no entendimento da Física, já que ainda não foi possível conciliar a gravidade e a mecânica quântica. A Física moderna assenta em dois grandes postulados: a teoria quântica de átomos e partículas subatómicas, e a teoria da gravidade de Einstein, conhecida como Relatividade, que descreve estrelas, galáxias e todo o universo. As estrelas, compostas por átomos, deveriam ser descritas, em teoria, pelas mesmas fórmulas, mas há pontas soltas que ainda não foram compreendidas.

Para Jesse Thaler, investigador da área de Física de partículas no M.I.T., há “evidências avassaladoras” de que haverá mais matéria no universo além da visível e já catalogada. “A matéria escura não pode ser vista, mas pode ser inferida pela influência gravitacional na matéria visível. A matéria escura é a prova mais consistente de que falta algo nas leis fundamentais da Física, pelo que identificá-la será crucial nas próximas décadas para construir a Teoria de Tudo.”

Seth Lloyd, engenheiro mecânico e especialista em computação quântica no M.I.T., ainda se assume cético de que a Teoria de Tudo seja alcançada através de inteligência artificial. “Não temos nada próximo desta inteligência artificial quântica”, reconhece o investigador. No entanto, Seth Lloyd também explica que os computadores quânticos poderão, em teoria, executar uma variedade de tarefas, como a “análise de dados, problemas de classificação e de sistemas não lineares complexos”, com “muito mais eficiência do que a inteligência artificial clássica”.

Maria Spiropulu lembra que a comunidade científica hoje acredita que as leis fundamentais da Natureza e as origens do espaço-tempo são quânticas. “Uma Teoria de Tudo faria uma ponte entre a física quântica e a física gravitacional de uma estrutura. Podemos sondar melhor esta teoria usando as vantagens quânticas.” Não existe ainda tecnologia com tal robustez, e Edward Witten, do Institute for Advanced Study, de Princeton, defende que a verdadeira questão é se é realmente “possível construir uma máquina capaz de pensar de forma independente sobre a física”. O investigador consegue, no entanto, imaginá-la e projetar um cenário, no final do século XXI, em que a tecnologia exista.

Os cientistas levantam a questão de que, a ser concebida por máquinas, a Teoria de Tudo pode não ser inteligível para os seres humanos, mas Jesse Thaler salienta que o avanço científico “só tem valor” se os humanos o puderem compreender. “A inteligência artificial desempenhará um papel na descoberta deste mistério, mas, neste momento, a ingenuidade e a criatividade humana são necessárias para fazer as perguntas certas para que a inteligência artificial procure as respostas. O que está neste momento a impedir que a tecnologia consiga a Teoria de Tudo é a incapacidade humana de fazer a pergunta certa, por ainda a desconhecer. Mas esse avanço será feito numa colaboração entre o cérebro humano e a máquina.”

Catarina Maldonado Vasconcelos. Expresso, Semanário#2513, 24.12.2020

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