Num artigo publicado em junho de 1981, o escritor italiano Italo Calvio exortou os seus compatriotas a redescobrir o prazer de ler os clássicos. Era necessário, porém, especificar o conceito de "clássicos".
Através de 14 proposições, Calvino apresenta-nos uma definição diferenciada.
Um clássico é:
- um livro que relemos
- um livro que constitui uma riqueza para quem o tenha lido e amado e para quem se reserva a sorte de lê-lo pela primeira vez nas melhores condições para o apreciar
- um livro que exerce uma influência particular quando se impõe como inesquecível e quando se oculta nas dobras da memória, mimetizando-se como inconsciente coletivo ou individual
- um livro cuja releitura é sempre uma leitura
- um livro cuja primeira leitura é na verdade uma releitura
- um livro que nunca para de dizer o que tem a dizer
- um livro que traz consigo as leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram
- um livro que provoca leituras críticas e continuamente se liberta delas
- um livro que, quanto mais pensamos conhecer, por ouvir falar dele, mais se revela novo, inesperado, inédito, quando é lido, de facto
- um livro que se configura como o universo, à semeljança de um talismã
- um livro que serve para nos definir em relação a ele ou contra ele
- um livro que vem antes de outros clássicos, se encaixa numa genealogia
- um livro que reduz os assuntos atuais a um ruído de fundo
- um livro que persiste como um rumor de fundo onde os assuntos atuais dominam
A partir destas e de outras definições de clássicos que nos oferece no primeiro capítulo de Porquê ler os clássicos?, Calvino vai dar resposta à pergunta que dá o título a este livro, numa série de ensaios que percorrem alguns dos pontos mais altos da literatura e do pensamento mundiais. "A Odisseia", Xenofonte, Ovídio, Plínio, o Velho, Tirant lo Blanc, Ariosto, Galileu, Robinson Crusoe, Cândido, Diderot, Stendhal, Balzac, Dickens, Flaubert, Tolstoi, Henry James, Robert Louis Stevenson, Conrad, Hemingway, Borges e muitos outros autores e obras definitivamente clássicos.
Ratio
Nesta perspectiva exaustiva, Italo Calvino também nos dá a sua fórmula para a constituição de uma biblioteca ideal: metade constituída pelos livros cuja leitura foi importante para nós e outra metade destinada aos livros que ainda não lemos mas de cuja existência e interesse suspeitamos. Por esta razão, ele propõe que haja “uma prateleira vazia para as surpresas, as descobertas ocasionais."
Fonte: Italo Calvino (2015). Porquê ler os clássicos?. Lisboa: Dom Quixote.
💻A biblioteca no E@D
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