A cultura do nosso tempo, partilhada por pais e escolas, criou a ideia de que a leitura tem de ser algo academicamente útil, que a criança só deve ler se o livro acrescentar um conhecimento que depois poderá usar na escola. Qual é o efeito desta imposição do excel à leitura? Os miúdos só leem para estudar, só leem o que é preciso para passar nos testes; fora isso, não leem, não são leitores, porque não foram ensinados a ler só porque sim, só porque é divertido e interessante por si só - um desastre cívico e humanista
Meu caro, v. tem crianças que não gostam de ler? Sugiro que leia esta peça da Atlantic sobre os jovens e a leitura; vai de certo revolucionar a maneira como vê esse problema. Ao contrário do que se pensa, a culpa pelo reduzido interesse pela leitura dos mais novos não está necessariamente nos ecrãs, nos telemóveis, na Internet. Ou melhor, os ecrãs não são os únicos culpados e, sobretudo, não são os mais importantes. O problema começa na forma como os pais e a escola de hoje veem a leitura. O problema, meu caro, começa na cultura dos rankings e no utilitarismo vigente.
Ou seja, a cultura do nosso tempo, partilhada por pais e escolas, criou a ideia de que a leitura tem de ser algo academicamente útil, que a criança só deve ler se o livro acrescentar um conhecimento que depois poderá usar na escola. Qual é o efeito desta imposição do excel à leitura? Os miúdos só leem para estudar, só leem o que é preciso para passar nos testes; fora isso, não leem, não são leitores, porque não foram ensinados a ler só porque sim, só porque é divertido e interessante por si só - um desastre cívico e humanista.
Meu caro, é preciso dizer aos pequenos que é interessante ou desafiante ler um romance. Mais do que dizer, é preciso mostrar isso com o nosso exemplo. Não há ali uma utilidade escolar imediata, há apenas uma "utilidade" humanista, há apenas um esticar da imaginação. De igual forma, um livro de Ciência ou de História tem um interesse per se, porque é bom aprender, porque é bom esticar a nossa curiosidade. Não se deve ler apenas para estudar para os testes que nos dão os rankings.
É por tudo isto que é muito comum conhecermos grandes profissionais no sentido técnico – médicos ou biólogos, por exemplo – que só sabem ler coisas para a sua profissão. Não são leitores, não leem romances ou livros de História só porque é bom ler. E isto é um desastre cívico e humanista. Repare, de resto, noutro pormenor: muitos desenhos animados têm sempre um enfoque académico (ensinar Matemática ou Inglês) em vez de ter o enfoque narrativo de sempre: contar uma história que estique a imaginação estética e moral das crianças.
Ou seja, a cultura do nosso tempo, partilhada por pais e escolas, criou a ideia de que a leitura tem de ser algo academicamente útil, que a criança só deve ler se o livro acrescentar um conhecimento que depois poderá usar na escola. Qual é o efeito desta imposição do excel à leitura? Os miúdos só leem para estudar, só leem o que é preciso para passar nos testes; fora isso, não leem, não são leitores, porque não foram ensinados a ler só porque sim, só porque é divertido e interessante por si só - um desastre cívico e humanista.
Meu caro, é preciso dizer aos pequenos que é interessante ou desafiante ler um romance. Mais do que dizer, é preciso mostrar isso com o nosso exemplo. Não há ali uma utilidade escolar imediata, há apenas uma "utilidade" humanista, há apenas um esticar da imaginação. De igual forma, um livro de Ciência ou de História tem um interesse per se, porque é bom aprender, porque é bom esticar a nossa curiosidade. Não se deve ler apenas para estudar para os testes que nos dão os rankings.
É por tudo isto que é muito comum conhecermos grandes profissionais no sentido técnico – médicos ou biólogos, por exemplo – que só sabem ler coisas para a sua profissão. Não são leitores, não leem romances ou livros de História só porque é bom ler. E isto é um desastre cívico e humanista. Repare, de resto, noutro pormenor: muitos desenhos animados têm sempre um enfoque académico (ensinar Matemática ou Inglês) em vez de ter o enfoque narrativo de sempre: contar uma história que estique a imaginação estética e moral das crianças.
Henrique Raposo, Expresso, 24 de agosto de 2023
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