Semana da Leitura |
Dia Mundial da Poesia
Porque a leitura é uma festa, o Dia mundial da poesia foi dia de festa na Camilo!
A "Festa da Poesia" começou às 9h 45m, na escadaria de acesso à biblioteca.
Alunos do 8º C - a Marta, o Rodrigo e a Susana - fizeram a leitura dramatizada do poema de José Luís Peixoto "Palavras para a minha mãe", que transcrevemos:
Alunos do 8º C - a Marta, o Rodrigo e a Susana - fizeram a leitura dramatizada do poema de José Luís Peixoto "Palavras para a minha mãe", que transcrevemos:
Palavras para a Minha
Mãe
mãe, tenho pena.
esperei sempre que entendesses
as palavras que nunca disse e os gestos que nunca fiz.
sei hoje que apenas esperei, mãe, e esperar não é suficiente.
pelas palavras que nunca disse, pelos gestos que me pediste
tanto e eu nunca fui capaz de fazer, quero pedir-te
desculpa, mãe, e sei que pedir desculpa não é suficiente.
às vezes, quero dizer-te tantas coisas que não consigo,
a fotografia em que estou ao teu colo é a fotografia
mais bonita que tenho, gosto de quando estás feliz.
lê isto: mãe, amo-te.
eu sei e tu sabes que poderei sempre fingir que não
escrevi estas palavras, sim, mãe, hei de fingir que
não escrevi estas palavras, e tu hás de fingir que não
as leste, somos assim, mãe, mas eu sei e tu sabes.
PEIXOTO, José Luís, A Casa, a Escuridão, Lisboa: Temas e Debates
as palavras que nunca disse e os gestos que nunca fiz.
sei hoje que apenas esperei, mãe, e esperar não é suficiente.
pelas palavras que nunca disse, pelos gestos que me pediste
tanto e eu nunca fui capaz de fazer, quero pedir-te
desculpa, mãe, e sei que pedir desculpa não é suficiente.
às vezes, quero dizer-te tantas coisas que não consigo,
a fotografia em que estou ao teu colo é a fotografia
mais bonita que tenho, gosto de quando estás feliz.
lê isto: mãe, amo-te.
eu sei e tu sabes que poderei sempre fingir que não
escrevi estas palavras, sim, mãe, hei de fingir que
não escrevi estas palavras, e tu hás de fingir que não
as leste, somos assim, mãe, mas eu sei e tu sabes.
PEIXOTO, José Luís, A Casa, a Escuridão, Lisboa: Temas e Debates
De seguida, os alunos do 9º A leram poemas de Camões, Miguel Torga, Sophia de Mello Breyner, Ruy Belo, Fernando Pessoa, Nuno Júdice, José Gomes Ferreira, Carlos de Oliveira e Florbela Espanca.
A terminar este momento de festa da poesia partilhado com toda a comunidade escolar, elementos do grupo Dar Voz às Palavras - Ana Margarida (aluna do 11º ano), Rosa Canelas (professora da Camilo), Leonor Vaz de Carvalho (ex-professora da Camilo), João Ribeiro (Encarregado de Educação de um dos alunos da escola) - leram poemas de Camões, Adília Lopes, João de Deus, António Gedeão, Daniel Maia Pinto Rodrigues, Manuel Bandeira, Miguel Torga, A. M. Pires Cabral e Manuel Vaz de Carvalho.
Leitura na escadaria de acesso à Biblioteca |
Um dos poemas lidos foi "Trem de Ferro!, do poeta brasileiro Manuel Bandeira (1886 - 1968):
Café
com pão
Café com pão
Café com pão
Virge Maria que foi isso maquinista?
Agora sim
Café com pão
Agora sim
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força
(trem de ferro, trem de ferro)
Oô...
Foge, bicho
Foge, povo
Passa ponte
Passa poste
Passa pasto
Passa boi
Passa boiada
Passa galho
De ingazeira
Debruçada
No riacho
Que vontade
De cantar!
Oô...
(café com pão é muito bom)
Quando me prendero
No canaviá
Cada pé de cana
Era um oficiá
Oô...
Menina bonita
Do vestido verde
Me dá tua boca
Pra matar minha sede
Oô...
Vou mimbora vou mimbora
Não gosto daqui
Nasci no sertão
Sou de Ouricuri
Oô...
Vou depressa
Vou correndo
Vou na toda
Que só levo
Pouca gente
Pouca gente
Pouca gente...
(trem de ferro, trem de ferro)
Café com pão
Café com pão
Virge Maria que foi isso maquinista?
Agora sim
Café com pão
Agora sim
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força
(trem de ferro, trem de ferro)
Oô...
Foge, bicho
Foge, povo
Passa ponte
Passa poste
Passa pasto
Passa boi
Passa boiada
Passa galho
De ingazeira
Debruçada
No riacho
Que vontade
De cantar!
Oô...
(café com pão é muito bom)
Quando me prendero
No canaviá
Cada pé de cana
Era um oficiá
Oô...
Menina bonita
Do vestido verde
Me dá tua boca
Pra matar minha sede
Oô...
Vou mimbora vou mimbora
Não gosto daqui
Nasci no sertão
Sou de Ouricuri
Oô...
Vou depressa
Vou correndo
Vou na toda
Que só levo
Pouca gente
Pouca gente
Pouca gente...
(trem de ferro, trem de ferro)
"Trem de ferro", um poema, três leituras. Aqui ficam as sugestões.
- Poema musicado pelo compositor brasileiro Almeida Prado (1943-2010) e interpretado pela cantora lírica Victoria Kerbauy:
- Poema musicado por Tom Jobem e interpretado por Olívia Hime:
- Montagem cénica e musicada do poema pelos alunos do 1º ano de Educação Artística da Universidade de São Judas Tadeu, Brasil:
Um outro poema lido foi "Não sei se me interessei pelo rapaz", de Adília Lopes:
Não sei se me interessei pelo rapaz
por ele se interessar por estrelas
se me interessei por estrelas por me interessar
pelo rapaz hoje quando penso no rapaz
penso em estrelas e quando penso em estrelas
penso no rapaz como me parece
que me vou ocupar com as estrelas
até ao fim dos meus dias parece-me que
não vou deixar de me interessar pelo rapaz
até ao fim dos meus dias
nunca saberei se me interesso por estrelas
se me interesso por um rapaz que se interessa
por estrelas já não me lembro
se vi primeiro as estrelas
se vi primeiro o rapaz
se quando vi o rapaz vi as estrelas
LOPES, Adília. Quem quer casar com a poetisa?, Lisboa: Quasi Edições, 2001
Terminada a leitura partilhada com a Comunidade Escolar, os elementos do grupo Dar voz às Palavras, desta vez também com Roberto Brito, Auxiliar da Biblioteca, foram às salas de aula partilhar a leitura de alguns poemas com alunos e professores - fazer a festa da poesia!
- 7º ano (A e B);
- 8º ano (C e D);
- 9º ano (B, D e E);
- 10º ano (A, E e I);
- 11º ano (F e H);
- 12º ano (C e E).
.
Ao visitar o 8º C, onde estava a decorrer a aula de Biologia com a professora Fátima Assunção, a equipa Dar voz às palavras foi agradavelmente surpreendida e, antes de partilhar as suas leituras, ouviu ler um texto coletivo elaborado previamente pela turma - um rap sobre a água!
A Equipa da Biblioteca agradece a todos os professores que se disponibilizaram para participar na celebração da festa da poesia, cedendo algum tempo das suas aulas: Alcina Gonçalves, Ana Paula Parente, Aurora Carvalho, Celeste Ribeiro, Elza Pinto, Fátima Assunção, Graça Campolargo, Joaquim Almeida, Margarida Soares, Maria João Cunha, Maria José Alfaiate, Maria Isabel Eiró, Manuel Carvalho, Natália Almeida e Rui Fernandes.
Aqui (também) há poesia!
O Dia Mundial da Poesia foi ainda assinalado com uma nova edição/distribuição de poemas, inseridos na rubrica Aqui (também) há poesia!, que teve como tema de fundo a poesia e a palavra poética.
Alguns dos poemas de caráter metapoético distribuídos:
Soneto
Rudes e breves as palavras pesam
mais do que as lajes ou a vida, tanto,
que levantar a torre do meu canto
é recriar o mundo pedra a pedra;
mina obscura e insondável, quis
acender-te o granito das estrelas
e nestes versos repetir com elas
o milagre das velhas pederneiras;
mas as pedras do fogo transformei-as
nas lousas cegas, áridas, da morte,
o dicionário que me coube em sorte
folheei-o ao rumor do sofrimento:
ó palavras de ferro, ainda sonho
dar-vos a leve têmpera do vento.
Soneto
Rudes e breves as palavras pesam
mais do que as lajes ou a vida, tanto,
que levantar a torre do meu canto
é recriar o mundo pedra a pedra;
mina obscura e insondável, quis
acender-te o granito das estrelas
e nestes versos repetir com elas
o milagre das velhas pederneiras;
mas as pedras do fogo transformei-as
nas lousas cegas, áridas, da morte,
o dicionário que me coube em sorte
folheei-o ao rumor do sofrimento:
ó palavras de ferro, ainda sonho
dar-vos a leve têmpera do vento.
OLIVEIRA,
Carlos de (2001). Trabalho Poético.
Lisboa: Círculo de Leitores, p. 161
A Forma Justa
Sei que seria possível construir o mundo justo
As cidades poderiam ser claras e lavadas
Pelo canto dos espaços e das fontes
O céu o mar e a terra estão prontos
A saciar a nossa fome do terrestre
A terra onde estamos — se ninguém atraiçoasse — proporia
Cada dia a cada um a liberdade e o reino
— Na concha na flor no homem e no fruto
Se nada adoecer a própria forma é justa
E no todo se integra como palavra em verso
Sei que seria possível construir a forma justa
De uma cidade humana que fosse
Fiel à perfeição do universo
Por isso recomeço sem cessar a partir da página em branco
Por isso recomeço sem cessar a partir da página em branco
E este é meu ofício de poeta para a reconstrução do mundo
ANDRESEN, Sophia de Mello Breyner (1986). O Nome das Coisas, 2ª ed., Lisboa: Edições Salamandra
Filtro
O poema filtra
cada imagem
já destilada
pela distância,
deixa-a
mais límpida
embora
inadequada
às coisas
que tenta
captar
no passado
indiferente.
OLIVEIRA, Carlos de (1096). Micropaisagem, Lisboa: Dom Quixote
Orfeu Rebelde
Orfeu rebelde, canto como sou:
Canto como um possesso
Que na casca do tempo, a canivete,
Gravasse a fúria de cada momento;
Canto, a ver se o meu canto compromete
A eternidade no meu sofrimento.
Outros, felizes, sejam rouxinóis...
Eu ergo a voz assim, num desafio:
Que o céu e a terra, pedras conjugadas
Do moinho cruel que me tritura,
Saibam que há gritos como há nortadas,
Violências famintas de ternura.
Bicho instintivo que adivinha a morte
No corpo dum poeta que a recusa,
Canto como quem usa
Os versos em legítima defesa.
Canto, sem perguntar à Musa
Se o canto é de terror ou de beleza.
TORGA, Miguel (2007). Poesia Completa, Lisboa: Dom QuixoteCanto como um possesso
Que na casca do tempo, a canivete,
Gravasse a fúria de cada momento;
Canto, a ver se o meu canto compromete
A eternidade no meu sofrimento.
Outros, felizes, sejam rouxinóis...
Eu ergo a voz assim, num desafio:
Que o céu e a terra, pedras conjugadas
Do moinho cruel que me tritura,
Saibam que há gritos como há nortadas,
Violências famintas de ternura.
Bicho instintivo que adivinha a morte
No corpo dum poeta que a recusa,
Canto como quem usa
Os versos em legítima defesa.
Canto, sem perguntar à Musa
Se o canto é de terror ou de beleza.
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