É Carnaval, e estão as ruas
cheias
É Carnaval, e estão as ruas cheias
De gente que conserva a sensação,Tenho intenções, pensamento, ideias,
Mas não posso ter máscara nem pão.
Esta gente é igual, eu sou diverso —
Mesmo entre os poetas não me aceitariam.Às vezes nem sequer ponho isto em verso —
E o que digo, eles nunca assim diriam.
Que pouca gente a muita gente aqui!
Estou cansado, com cérebro e cansaço.Vejo isto, e fico, extremamente aqui
Sozinho com o tempo e com o espaço.
Detrás de máscaras nosso ser espreita,
Detrás de bocas um mistério acodeQue meus versos anódinos enjeita.
Sou maior ou menor? Com mãos e pés
E boca falo e mexo-me no mundo.Hoje, que todos são máscaras, és
Um ser máscara-gestos, em tão fundo...
“Carnaval”. Álvaro de Campos - Livro de Versos. Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993.
A palavra "Carnaval" (prováveis origens)
- no contexto pagão: no latim, “Carrum Navalis” designava os carros navais que faziam a abertura das Dionísias Gregas nos séculos VII a.C. e VI a.C.. Dava-se assim início ao momento de euforia e à inversão de valores que se estendiam pelas ruas das cidades.
- no contexto cristão: a palavra pode ter surgido em 590 d. C., quando o Papa Gregório I mudou o início da Quaresma para a quarta-feira, antes do sexto domingo que antecede a Páscoa (o domingo anterior passou a designar-se por “carne Vale", ou seja, pelo adeus à carne”, uma vez que terça-feira de carnaval era o último dia antes da quaresma em que era permitido comer carne, seguindo-se os 40 dias de jejum até à Páscoa).
Seja qual for a origem da palavra, o Carnaval surge sempre associado a festa, alegria, transgressão, cor, inversão de papéis, liberdade.
A festa - folia carnavalesca
As festividades do Carnaval tiveram início, muito provavelmente, no antigo Egito (com as criações burlescas e paródicas de sósias dos deuses e heróis e com rituais religiosos em que as pessoas se mascaravam e dançavam para agradecer aos deuses as boas colheitas).
A Grécia também celebrou o Carnaval com teatralizações coletivas de inversão carnavalesca de papéis (o rico vestia-se de pobre e o pobre de rico).
A celebração do mundo às avessas, com a quebra, temporária, da hierarquia de papéis também se observava na antiga Roma, de novembro a dezembro (as festividades, marcadas pelo excesso de bebidas e de sexo nas praças públicas, incluíam ainda corridas de cavalos, corridas de corcundas, desfiles de carros alegóricos e lançamento de ovos).
A Igreja católica, que não olhava com benevolência estas celebrações, dado o seu caráter transgressor e permissivo (associavam a origem pagã das festividades ao excesso libidinoso), acabaria por confinar a folia carnavalesca ao período que antecede o jejum e a abstinência da Quaresma.
O motivo do Carnaval na pintura
Domenico Tiépolo (1727-1804) - Cena de Carnaval (Museu do Louvre)
Pieter Bruegel, O Velho - A luta entre o Carnaval e a Quaresma (Museu de Viena de Áustria, 1559)
Joan Miró, O carnaval do Arlequim (1924-25)
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