Com Rosa Canelas
Dia 11 de dezembro | átrio da escola| 11:15
"É mais fácil construir uma estrada do que mudar a mentalidade do homem".
Lídia Jorge
Marido e outros contos, de Lídia Jorge
No passado dia 11 de dezembro, dia da consciencialização, na Camilo, da crua realidade da violência contra as meninas e as mulheres, a Comunidade Escolar pôde assistir à leitura do conto Marido, de Lídia Jorge, pela professora Rosa Canelas.
"Mas há noites em que o marido não chega às sete, nem às oito, nem às nove. E se não chegar às dez, ela sabe que não chegará senão de madrugada. É por isso que a hora crucial da vida da porteira acontece entre as cinco e as sete. É dentro desses minutos decisivos da tarde que se dita o dia e a noite da porteira. A porteira aos cinco para as cinco acende a vela, põe as mãos pedindo que ele chegue antes do jantar. Uma maçada se ele só vier de madrugada. Já ela o ouve tocar, depois de subir, abrir a porta do elevador com dificuldade, sair de lá lentamente com o pé rígido, e depois a chave começa a cair junto da porta, sente levantá-la do chão, deve estar a revolver a chave, até que por fim ele a enfia, a roda, a desprende, a saca, fica dentro de casa e a casa se enche do seu hálito até às bacias e às janelas. Tropeça no sofá da saleta e chama: Lúcia! Ó Lúcia!".
"O ser humilhado faz-me escrever. É claro que eu não escreveria só sobre a figura humilhada. Eu escrevo com as duas mãos: com uma mão, procuro demonstrar que uma coisa está errada, ou a revolta contra alguma coisa; com a outra, procuro compor alguma coisa que tenha a ver com a beleza. Mas a falta de fraternidade e a humilhação é uma coisa que a minha mão esquerda está permanentemente a trazer para a escrita".
"…
aconteceu até uma história muito interessante aí há uns cinco anos, na
Alemanha, onde houve um encontro com vários escritores, entre eles
Saramago, onde foi lido o meu conto em alemão ‘O Marido’, o qual
impressionou bastante a assistência e uma das perguntas que alguém me
fazia naquela grande sala da biblioteca era esta: ‘Mas isto não é uma
história absolutamente arcaica? Será que Portugal ainda tem este mundo?’
E a resposta foi esta: ‘Tem este mundo, na Alemanha existe este mundo,
na Inglaterra existe este mundo, as pessoas é que não falam dele. Há
estatísticas que dizem que morrem mais mulheres violentadas pelos seus
maridos do que em acidentes de automóvel, o que é horrível, mas parece
que corresponde à realidade’".
Lídia
Jorge, «Excepções e regra» in Depoimento para o álbum «100 Mulheres
Portuguesas», disponível em
http://arquivolidiajorge.blogspot.pt/search/label/Depoimentos
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