sexta-feira, 2 de junho de 2017

Somos contos, contando contos, nada






Nada fica de nada. Nada somos.
Um pouco ao sol e ao ar nos atrasamos
Da irrespirável treva que nos pese
Da húmida terra imposta,
Cadáveres adiados que procriam.

Leis feitas, estátuas vistas, odes findas —
Tudo tem cova sua. Se nós, carnes
A que um íntimo sol dá sangue, temos
Poente, porque não elas?
Somos contos contando contos, nada.


© RICARDO REIS 
28-9-1932 
In Poemas de Ricardo Reis. Fernando Pessoa, 1994 
Imprensa Nacional - Casa da Moeda, Lisboa 



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