terça-feira, 8 de junho de 2021

Novos Media, Novas Literacias, e Heróis do Digital?

 









por Marta Neves

Investigadora, ISCTE-IUL


Daqui a 20 anos, qual será o perfil dos consumidores de conteúdos mediáticos?

Como se irão envolver e interagir com os media? 

Como irão aceder à multiplicidade de conteúdos disponíveis? 

Que suportes irão usar? O que entretanto terá perdido interesse para eles? Irão comprar jornais em papel? Ou terão “apagado” a memória desse hábito dos mais velhos? 

Um caminho possível para tentar perceber tendências futuras pressupõe associar uma visão diacrónica das evoluções ocorridas, no contexto português, ao nível dos hábitos de consumo mediáticos, recuando no tempo cerca de 15 anos pelo menos. Ao mesmo tempo exige que se esteja atento ao ambiente mediático em que actualmente as crianças mais novas se movimentam. 

Este exercício implicará que se atenda à “herança” das famílias assim como de outros contextos de socialização e pertença da infância. Por outro lado, será necessário identificar tendências emergentes, ou seja, estar atento àquilo que, nos dias de hoje, os mais novos privilegiam e valorizam; as novidades que os próprios introduzem e impõem por si e que resulta da sua cultura de pares - mas também o que os afasta dos modelos de “dever ser”, delineados pelos cuidadores.

Como caracterizar o perfil de crianças e adolescentes, designados de forma genérica sob grandes chavões como “Digital Generation”, “Google Generation”, “Net Generation”, “Cyberkid Generation”, “Geração Magalhães” ou, mais recentemente, “Touch-Screen Generation”? A equação “Identidade Geracional = Identidade Tecnológica” tem vindo a ganhar centralidade em vários discursos. Ela traduz a ideia de que as novas tecnologias ocupam um espaço decisivo na vida das crianças, influenciando-as sob os mais diversos aspetos, alterando profundamente os termos em que socializam, comunicam, aprendem ou criam. Esta perspetiva é sustentada por um optimismo em relação às capacidades de uma geração no que diz respeito às suas práticas e interacções com as novas tecnologias da informação e comunicação. 

Basta recuperar o pensamento de Tapscott: em Growing up Digital: The Rise of the Net Generation o autor faz a apologia do empoderamento tecnológico dos mais novos que neste contacto com a tecnologia democratizadora, de uma forma intrínseca, ganham ou desenvolvem mais criatividade e autonomia. Sob este ponto de vista os adultos são encarados como elementos tecno fóbicos, conservadores e inflexíveis; aprofundando-se assim a ideia de fosso digital entre gerações (Tapscott, 1998 in Buckingham, 2006: 7, 8). 

Se formos até à raiz desta formulação, regressamos a Prensky e ao seu binómio “digital natives” contra “digital immigrants” (2001): com esta sua metáfora o autor coloca em diferentes patamares de competência aqueles que aprendem uma língua nova e os que são seus nativos. Neste sentido, os mais novos surgiriam como native speakers da linguagem digital... Num cenário assim, como poderiam elementos nativos ser ensinados por imigrantes que não falam/usam a mesma linguagem com igual destreza que os primeiros? Daí a justificação para a menção de um fosso geracional entre adultos e os mais novos no que respeita à interacção com as tecnologias (Livingstone et al., 2006:104). Este entendimento tornou-se num lugar-comum que foi sendo propagado sobretudo na esfera dos interesses comerciais e da indústria, mas também no âmbito de políticas governamentais, aí ganhando espaço na orientação de directrizes de planos educativos. 

Contudo, ao investigar o fenómeno da suposta supremacia dos digital natives, há autores que alertam para a necessidade de se realizar uma leitura mais fina e fundamentada desta generalização.

Neves, Marta. "Novos Media, Novas Literacias, e Heróis do Digital?" in Silva, Sérgio Gomes da e Pereira, Sara (Coord.) (2014). Atas do 2.º Congresso "Literacia, Media e Cidadania". Lisboa: Gabinete para os Meios de Comunicação Social ISBN: 978-989-96478-3-1
 
Pode ler o artigo completo aqui, pp. 37-44


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