#alermaisemelhor
Este é um ensaio “sobre a ideia de que já não se pode dizer nada” (é o subtítulo) escrito na Espanha dos nossos dias, mas interpelando constantemente a cultura americana de onde provêm quase todos os termos do debate. Aplica-se, conforme a autora escreve (“a Europa não é diferente”), a todos nós. O ensaio, género por excelência da liberdade de escrita, presta-se bem à passagem da análise à participação (não usa o termo, mas talvez se aplicasse aqui a noção de ‘observação participante’) e esse será mesmo o fito do livro. Como a autora explica, não veio aqui para ser “boazinha”.
O texto percorre a história da produção e difusão de termos hoje correntes no debate público, como “neopuritanismo” e “snowflakes”, para evidenciar como a sua difusão constitui demasiadas vezes uma subversão inadvertida da realidade que reportam (e a análise ao uso generalizado de linguagem trumpista é muito pertinente). Para isso serve-se de uma oposição entre os ofendidinhos do título e “ferozes analistas”, os primeiros sendo acusados pelos segundos de censores moralistas, quando, como a autora indica (de forma sumária mas concreta), as ofensas que suscitam os ultrajes dos analistas “independentes” estão muito mais próximas do sentir generalizado que a opinião que as contestam: “Ao espernear contra as mudanças sociais e a crescente pluralidade de vozes, mascara os verdadeiros problemas de liberdade de expressão que temos no nosso país e o fantasma que percorre a Europa: o fascismo.” Tudo isto é matéria que excede os limites do ensaio, pode concluir-se. Mas, e apesar do foco no seu tão peculiar país, este texto não esquece problemas de fundo como a diferença geracional no uso da linguagem, ainda que pouco os possa explorar. Mais do que transposições para o caso português, aí reside o seu interesse.
Lucía Lijtmaer. Ofendidinhos. Lisboa: Objectiva, 2025. 96 págs. Ensaio
Sem comentários:
Enviar um comentário